CARVÃO MINERAL - O COMBUSTÍVEL FÓSSIL MAIS POLUENTE DA TERRA

Ou alguém ainda tem dúvidas ou contesta a afirmação? Importante reserva mineral que deveria ficar para o uso das futuras gerações, quando estiverem esgotados todos os recursos superficiais da terra. Para quando descobrirem formas adequadas e menos impactantes de extração. Para quando as pessoas perceberem que o dinheiro não se come! Para quando realmente existir consciência ecológica.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

MINAS DE CARVÃO CONDENADAS TEM PRAZO ATÉ 2020...

S E N T E N Ç A

Tudo é certo em saindo das mãos do autor das coisas, tudo degenera nas mãos do homem. Ele obriga a terra a nutrir as produções de outra, uma árvore a dar frutos de outra; mistura e confunde os climas, as estações; mutila seu cão, seu cavalo, seu escravo, transforma tudo, desfigura tudo; ama a deformidade, os monstros (Rosseau).

Processo : 93.8000533-4
Autor : Ministério Público Federal
Réus : Nova Próspera Mineração S.A.
Companhia Carbonífera Urussanga
João Zanette
Carbonífera Criciúma S.A.
Paulo Agrício Freitas
Carbonífera Metropolitana S.A.
Realdo Santos Guglielmi
Reginaldo José Guglielmi
Cia. Brasileira Carbonífera de Araranguá
Carbonífera Barro Branco S.A.
Carbonífera Treviso S.A.
Augusto Baptista Pereira
Cia. Carbonífera Catarinense S.A.
Fidelis Barato Filho
Coque Catarinense Ltda.
Gilberto Luiz Zanette
Gilson Heitor Zanette
Carbonífera Palermo Ltda.
Valdir Darós
IBRAMIL - Ibracoque Mineração Ltda.
Álvaro Luiz Bocayuva Catão
Sebastião Netto Campos
União Federal
Companhia Siderúrgica Nacional
Estado de Santa Catarina


Vistos, etc.

Trata-se de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal contra as empresas Nova Próspera Mineração S.A.(Sucessora da Carbonífera Próspera), Companhia Carbonífera Urussanga, Carbonífera Criciúma S.A., Carbonífera Metropolitana S.A., Cia. Carbonífera de Araranguá, Carbonífera Barro Branco S.A., Carbonífera Treviso S.A., Cia Carbonífera Catarinense, Coque Catarinense Ltda., Carbonífera Palermo Ltda., IBRAMIL - Ibracoque Mineração Ltda., seus diretores e sócios majoritários: João Zanette, Paulo Agrício de Freitas, Realdo Santos Guglielmi, Reginaldo José Guglielmi, Augusto Baptista Pereira, Fidelis Barato Filho, Gilberto Luiz Zanette, Valdir Darós, Álvaro Luiz Bocayuva Catão e Sebastião Netto Campos, e a União Federal.

Alega o MPF que, no período entre 1972 e 1989, conforme dados fornecidos pelo Departamento Nacional da Produção Mineral - DNPM, a extração de carvão na região carbonífera de Santa Catarina, em especial nos Municípios de Criciúma, Forquilhinha, Lauro Müller, Urussanga, Siderópolis, Içara e Orleãns, elevou-se sobremaneira, correspondendo a 80,19% do carvão minerado até então. Apresenta, ainda, demonstrativo dos percentuais correspondentes a cada uma das empresas antes mencionadas.

Afirma que, como resultado da mineração realizada, considerando a realização de mineração a céu aberto, a descuidada disposição final de rejeitos sólidos e do indiscriminado lançamento de efluentes dos lavadores e das drenagens de minas nos cursos d'água, foram comprometidos cerca de 4.000 a 5.000 hectares de terras nos Municípios-sedes de minas e usinas, assoreadas e contaminadas as três bacias hidrográficas da região, quais sejam, as bacias dos rios Araranguá, Tubarão e Urussanga e, ainda, atingidas as lagoas Santo Antônio, Imaruí e Mirim.

Ademais, tal situação prejudica seriamente a saúde da população, causando diversas doenças e aumentando os índices de outras, como a anencefalia.

A partir do ano de 1980, houve normatização de programas de conservação ambiental e controle de poluição destinados à região carbonífera e no ano de 1992 foi instituído o projeto PROVIDA-SC.

Sustenta o Ministério Público a responsabilidade das sociedades mineradoras e dos sócios, que as administraram de forma culposa, pela da recuperação da região agredida e pela indenização dos danos causados, de acordo com os artigos 1.518 e seguintes do Código Civil, incisos VIII, X, XI e XII do art. 47 do Decreto-Lei nº 318/67, incisos XIV e XVI da Portaria GM/MINTER nº 13/76, inciso I da Portaria Interministerial nº 917/82 e com o artigo 225, § 2º, da Constituição da República.

Quanto à União Federal, entende haver responsabilidade pelos prejuízos decorrentes da mineração realizada antes de 1972 e ainda por omissão em fiscalizar e punir, conforme o Decreto-Lei nº 318/67, artigos 63, 65, e, e 88, Decreto-Lei nº 1.413/75, artigos 1º e 2º, artigos 5º e 6º do Decreto nº 76.389/75 e artigo 37, § 6º, da Constituição da República.

Por fim, requer sejam compelidas as mineradoras e a União a projetar e executar a recuperação da região sul (Municípios arrolados no Decreto do PROVIDA-SC), com início da execução dos trabalhos em janeiro de 1996 e conclusão no ano 2000, contemplando as áreas de depósitos de rejeitos, áreas mineradas a céu aberto e minas abandonadas, bem como o desassoreamento, fixação de barrancas, descontaminação e retificação dos cursos d'água, além de outras obras que visem amenizar os danos sofridos principalmente pela população dos municípios-sede da extração e do beneficiamento, bem como, seja cominado aos requeridos a pena de multa de 1% do valor da causa por mês de atraso no cronograma de execução.

O MPF apresenta pedido sucessivo que requer seja apreciado em caso de demora que inviabilize o início dos trabalhos de recuperação em 1996. Tal pedido constitui-se na condenação das mineradoras e da União à entrega de quantia equivalente a US$ 95.902.079,00 (noventa e cinco milhões, novecentos e dois mil, setenta e nove dólares americanos), valor necessário estimado para a realização do Projeto de Recuperação da Qualidade de Vida da Região Sul de Santa Catarina (PROVIDA-SC), acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, e à indenização dos danos pessoais acarretados à população dos municípios-sede da extração de carvão, estimados em um salário mínimo por habitante, valores a serem aplicados nas comunidades mais diretamente atingidas, em obras complementares como hospitais e escolas especializados. Requer, ainda, a condenação dos réus à pena de multa, a título de compensação à população em virtude do atraso no início da execução da sentença, de 10% do valor da condenação a título de danos pessoais, ao ano, e honorários advocatícios. Ademais, pede seja o valor da condenação rateado entre os requeridos em razão do montante de carvão extraído no período de 1972 a 1989, arcando a União com o percentual relativo à extração precedente e com a parcela do dano que por qualquer razão não for recomposta por alguma mineradora ou seu sócio-administrador e que os sócios que geriram as empresas mineradoras sem atenção à lei sejam solidariamente responsáveis. Requer a condenação das mineradoras à recomposição dos danos individuais inflingidos nos últimos vinte anos e que vierem a ser apurados nas liquidações de sentença promovidas pelos lesados. Ao final, pede seja o valor resultante da condenação recolhido, em dinheiro, devidamente corrigido, a fundo para reconstituição dos bens lesados.

Acompanhou a inicial o inquérito civil público, autuado em apenso a estes autos, instaurado em virtude da degradação ambiental causada pelas empresas de extração de carvão do sul de Santa Catarina, a fim de definir as responsabilidades das mineradoras e de seus diretores e determinar as medidas administrativas e judiciais cabíveis.

As rés-mineradoras foram citadas e notificadas, conforme requereu o autor, de que o Ministério Público Federal não hesitará em pleitear a cessação das atividades e/ou caducidade da concessão de lavra se doravante não satisfizerem integralmente as exigências dos órgãos ambientais, FATMA, IBAMA e DNPM, acaso estes se omitam na aplicação das penalidades.

Realizadas as citações dos demais réus.

A Companhia Carbonífera de Urussanga - CCU contestou (fls. 25/44) argüindo preliminares de litispendência com a ação civil pública proposta na Comarca de Urussanga e carência de ação por falta de interesse processual. No mérito, afirma, inicialmente, inexistir inquérito civil público, peça obrigatória como garantia do devido processo legal e que demonstraria as realizações da ré no sentido de diminuir os danos causados pela produção mineral. Tece considerações sobre as necessidades do progresso e da produção industrial, alegando que deve haver um equilíbrio entre esses valores e a proteção ambiental. Sustenta ter envidado esforços e aplicado recursos financeiros para minimizar a degradação ambiental, com projeto aprovado pela FATMA. Assim, entende que há de ser realizada distinção entre as empresas mineradoras. Alega que toda a indústria de extração do carvão segue as regras fixadas pelo Governo Federal, que inclusive determina o preço final do produto, mas sem prever parcela destinada à recuperação ambiental. Com base do art. 225, § 2º, da Constituição da República, afirma que a atividade de mineração causa danos por sua própria natureza, não se tratando, portanto, de ato ilícito, e que a recuperação da área degradada deve ser feita de acordo com a solução técnica exigida pelo órgão público competente, sem que se deixe de dar continuidade à extração. Sustenta que a obrigação de reparar qualquer dano decorre do ato ilícito. Conclui não se tratar a mineração de ato ilícito, porque o direito de lavra decorre de concessão outorgada pela União, de acordo com a CF. Responsabiliza a União pela omissão que gerou o evento danoso. Diz ter licenciamento ambiental de operação expedido pela FATMA. Por fim, impugna os valores requeridos e requer o reconhecimento da prescrição.

A contestação da Coque Catarinense veio aos autos (fls. 174/84). A empresa argúi as preliminares de carência de ação e de inépcia da inicial, por falta de sintonia entre a narração dos fatos e o pedido. No mérito, diz ter plano de reabilitação ambiental aprovado pela FATMA e licença ambiental de operação. Também firmou convênio com a Prefeitura de Siderópolis, visando a recuperação ambiental. Alega não minerar a céu aberto, e ainda, que, antes de 1986, a área em que exerce suas atividades era minerada por outras empresas. Sustenta que quota do Imposto Único Sobre Minerais (IUM) se destinava à recuperação do meio ambiente, o que acabou por não se efetivar na região.

Às fls. 333/43 encontra-se a contestação de Gilson Heitor Zanette e Gilberto Luiz Zanette, diretores da Coque Catarinense, nos mesmos termos daquela apresentada pela empresa.

A Carbonífera Metropolitana e seus diretores, Realdo Santos Guglielmi e Reginaldo José Guglielmi, contestaram (fls. 373/90). Argúem os réus a prescrição com base no art. 178, § 10, do CC, a ilegitimidade passiva dos sócios, porque não agiram com abuso de poder ou desobediência à lei e a inépcia da inicial, porque o pedido não estabelece relação direta entre o dano e seu causador. Repetem, no que denominam de mérito, os argumentos expendidos na preliminar de inépcia da inicial, dizendo que não lhes é atribuído qualquer dano específico, não há nexo de causalidade e identificação do agente causador, faltando ainda a demonstração das afirmações do autor e de que danos foram causados pela ré. Afirmam que, com base no relatório do PROVIDA, os danos foram causados pela União. Alegam que na composição do preço do carvão fixado pelo Governo Federal, falta parcela destinada à recuperação ambiental. Informam ter a empresa minerado apenas em subsolo, modalidade de extração que causa menos danos que aquela realizada a céu aberto, bem como estar executando projeto de recuperação ambiental. Questionam a abrangência do pedido, tendo em vista ser o PROVIDA destinado a toda região sul e a ações em diversas áreas, não podendo, assim, constituir parâmetro à condenação. Sustentam ser a União a responsável pela degradação ambiental decorrente da extração do carvão, em razão de tratar-se de atividade controlada, onde todas as determinações são dadas pelo Governo Federal. Alegam ser inaceitável o critério previsto na inicial para a divisão, entre os réus, do valor da indenização, porque o dano tem que ser individualizado segundo seu causador. No que se refere ao pedido relacionado com danos pessoais, afirmam não ter o MPF legitimidade para pleiteá-los, não ser a ação civil pública instrumento processual adequado para ressarcir interesses pessoais, e ainda, que tal indenização não pode ser genérica, mas deve corresponder ao efetivo prejuízo experimentado. Por fim, sustentam a inexistência de responsabilidade solidária dos sócios, porque jamais geriram a empresa em descumprimento à lei e apenas seguiram as orientações expedidas pelo Governo Federal. Requerem a improcedência da ação e a condenação do autor em honorários advocatícios.

Contestação da Carbonífera Criciúma, oferecida às fls. 540/8. Inicialmente, sustenta a requerida a prescrição qüinqüenal, em virtude de ser a União parte na lide, beneficiando a todos os demais litisconsortes. No mérito, afirma ter minerado apenas em subsolo e ter despendido esforços para compatibilizar a mineração e o controle ambiental, tendo realizado diversas obras neste sentido. Entretanto, diz não existir norma legal determinando a maneira de realizar o depósito do rejeito. Sustenta ser o controle da produção mineral realizado pelo Governo Federal e o Imposto Único Sobre Minerais instituído para minimizar os efeitos da mineração do carvão. Contudo, seus recursos não foram utilizados para esse fim. Alega ser o projeto PROVIDA mais amplo, não podendo ser parâmetro à condenação. Impugna os valores pretendidos, por serem genéricos e não corresponderem à responsabilidade das mineradoras. Insurge-se também quanto à forma do rateio.

A Nova Próspera Mineração S.A. apresenta sua defesa (fls. 566/85), argüindo, preliminarmente, a denunciação da lide à CSN, a sua ilegitimidade passiva, porque a CSN se obrigou a assumir todos os encargos civis, fiscais, trabalhistas e ambientais, anteriores a 01.10.91, a inépcia da inicial, e ainda, a prescrição. No mérito, aduz não ter responsabilidade pelos danos porque o pedido é baseado em período anterior a sua constituição social. Ademais, o pacote 1 adquirido não tem qualquer reserva de carvão a ser minerado a céu aberto. Afirma não estarem presentes os pressupostos da ação de indenização, pois não lhe foi atribuído qualquer dano específico, individualizado, não podendo a empresa ser condenada a indenizar danos que não provocou, não tendo o MPF demonstrado suas afirmações e existindo outras causas para a poluição ambiental no sul de Santa Catarina. Quanto ao PROVIDA, entende tratar-se de responsabilidade da União, uma vez que o governo federal sempre controlou a política do carvão sem destinar parcela de seu preço à recuperação ambiental e a requerida cumpriu suas determinações, praticando atividade lícita; de outra parte, o PROVIDA é mais amplo porque se trata de um conjunto de providências para toda a região sul, inclusive municípios em que não houve mineração, não guardando relação apenas com essa atividade. Portanto, não pode ser utilizado como parâmetro. Alega não ter minerado antes de 1991 ou a céu aberto. No que se refere aos danos pessoais, sustenta não ser a ação civil pública instrumento adequado a pleiteá-los, pois devem corresponder ao efetivo prejuízo experimentado individualmente. Por fim, afirma ser inaceitável o rateio proposto pelo autor, porque quem produziu mais não necessariamente poluiu mais. Requer honorários.

Oferecida a contestação de Paulo Agrício Freitas (fls. 690/701). Argúi as preliminares de ilegitimidade passiva ad causam, inépcia da inicial, e de prescrição. Diz ter a inicial feito apenas alegações genéricas, não lhe atribuindo responsabilidade por qualquer dano específico e individualizado. Afirma ser necessário à ação de indenização a caracterização do dano, a identificação do agente causador e o nexo causal. Alega ser o PROVIDA de responsabilidade da União e, como é mais amplo, não pode ser utilizado como parâmetro à indenização. Quanto às suas atividades, aduz ter, no período em que dirigiu a empresa, procurado minimizar a agressão ao meio ambiente, tendo obedecido as leis e não minerado a céu aberto. Não tendo havido gestão contrária à lei, não há respaldo para a responsabilidade solidária. No que se refere aos danos pessoais, sustenta não ser a ação civil pública instrumento adequado a pleiteá-los, pois devem corresponder ao efetivo prejuízo experimentado individualmente. Ademais, não tem o MPF legitimidade para agir em nome de terceiros. Por fim, diz ser inaceitável o rateio requerido pelo MPF, porque quem causa o prejuízo é o responsável pelo ressarcimento. Requer honorários.

A MF-CBCA contestou às fls. 716/22, dizendo pouco ter minerado a céu aberto e ter depositado corretamente seus rejeitos sólidos, realizando, inclusive, trabalhos de recuperação ambiental, pelo que as áreas vizinhas à mineração já estão normalizadas com seu auxílio. Informa acerca do desenvolvimento de projetos de preservação ambiental, com inúmeros trabalhos realizados. Portanto, entende necessária a elaboração de diagnóstico para identificar áreas degradadas e seus responsáveis, comprovando a recuperação ambiental realizada. Diz, ainda, ter realizado convênio com a UFSC para estudo das questões ambientais e elaboração de soluções. Sustenta ter sido a extração do carvão fomentada pelo governo federal, que ditava as regras do jogo sem prever a recuperação ambiental no preço do carvão. Alega não poder ser responsabilizada porque sempre cumpriu exigências governamentais e dos órgãos de fiscalização. Tece considerações sobre a conjuntura econômica do setor carbonífero e sobre sua situação falimentar. Afirma que o PROVIDA não é parâmetro a ser adotado porque se trata de cálculo político e abrange região maior. No que se refere aos danos pessoais pleiteados, aduz ser de responsabilidade do poder público a construção de escolas e hospitais, o que torna o cálculo muito volumoso.

Ao apresentar sua defesa (fls. 797/802), a Carbonífera Palermo argúi preliminar de ilegitimidade ativa do MPF e a prescrição. Alega, inicialmente que: a Mineração Palermo jamais utilizou subsídios governamentais, não se servindo de empréstimos ou frete subsidiado, pois sempre transportou às suas custas o carvão das minas ao lavador de Capivari utilizando-se de caminhões próprios e a seu cargo; exerceu atividades de mineração nas localidades de Palermo e Rio Hipólito, Municípios de Lauro Müller e Orleãns, respectivamente; os rios que passam pelas minas são o Rio Bonito e o Rio Hipólito, ambos piscosos, sendo a fauna psiciforme detectada pelos pescadores da região; a sua atividade produtiva foi encerrada em agosto de 1986, fato capciosamente omitido pelo Autor; de 1986 a 1989 a empresa estava inoperante, tendo paralisado suas atividades conforme Relatório de Paralisação enviado ao DNPM; na unidade mineira sita em rio Hipólito as atividades iniciaram em janeiro de 1978 e encerraram em dezembro de 1986; a mineração era basicamente subterrânea; houve mineração a céu aberto somente nas áreas restritas à embocadura das galerias de encosta; possuía lavador de carvão em ambas as minas, os quais foram desmontados por ocasião da paralisação das atividades, não possuindo, a empresa, desde então qualquer lavador instalado no Estado de Santa Catarina; os rejeitos sólidos oriundos de beneficiamento do carvão mineral bruto eram depositados de forma ordenada, em áreas restritas, próximas ao local das antigas instalações de beneficiamento (lavadores), tanto em Palermo como em Rio Hipólito; os rejeitos sólidos eram confinados em depósitos específicos, não o sendo jamais, sobre estradas, riachos e rios. Diz ter atendido a todas as determinações governamentais relativas à melhoria da qualidade ambiental, envidando esforços para minimizar o potencial poluente, a partir da Portaria Interministerial nº 917/82, pois anteriormente não havia que se falar em atividade potencialmente poluidora. Afirma que desde o ano de 1955 o local em que se situa é minerado por outros, existindo diversas outras mineradoras não mencionadas pelo autor. Sustenta ter minerado menos do que o apresentado pelo levantamento que acompanha a inicial. Ademais, a forma encontrada para quantificar a responsabilidade não mensura o dano causado, nem identifica o causador, devendo ser observadas as diferenças entre a mineração de subsolo e a céu aberto. Alega que, sendo a mineração controlada pelo governo federal, a responsabilidade pelos danos causados é da União.

Valdir Darós oferece sua contestação às fls. 818/21 em termos semelhantes à apresentada pela Carbonífera Palermo, argüindo, ainda, ser imprópria sua inclusão como réu, não se podendo confundir a pessoa do empresário com a empresa, pois não há permissivo legal ou prova de concorrência para o ato lesivo.

Augusto Baptista Pereira, às fls. 838/41, diz ter sido diretor da Carbonífera Treviso até 14/01/93. Alega que o PROVIDA não prevê contribuição por parte dos mineradores porque a indústria do carvão era controlada pelo governo federal, além do que os mineradores têm cumprido as exigências das autoridades incumbidas do controle.

A União veio aos autos (fls. 848/58) sustentando, inicialmente, a ocorrência da prescrição qüinqüenal nos termos do Decreto 20.910/32 e do DL 44.597/42 e a denunciação da lide ao Estado de Santa Catarina. No mérito, alega a ausência de substrato legal para a sua responsabilização. Diz que a atividade extrativa que resultou nos danos cuja reparação é buscada na presente ação foi realizada pelas empresas listadas à fl. 8 dos autos. Portanto, delas é a responsabilidade (art. 1.518 e ss. do CC, art. 225, § 2º, da CR e art. 1º do DL 1413/75). Quanto ao pedido relacionado com a mineração velha (anterior a 1972), defende a ocorrência da prescrição e a responsabilidade das mineradoras. No que se refere à responsabilidade por omissão em fiscalizar e punir, diz que a responsabilidade civil da administração pública (art. 37, § 6º, da CR) refere-se aos danos que seus agentes, nessa qualidade, causem a terceiros, não abrangendo a responsabilidade por terceiros ou atos da natureza. Ademais, os danos foram causados pelos mineradores, não sendo, assim, a União responsável pelos danos ambientais. Informa que desde 1978 vem envidando esforços para implantação de sistema de tratamento de rejeitos, cujas tratativas podem explicar a ausência de penalidades administrativas, o que, contudo, não modificaria os danos ambientais ocorridos. Alega ser inviável a teoria da responsabilidade civil do Estado pelo risco integral, uma vez que desvia a finalidade do Estado e é rejeitada pela Constituição. Rejeita a responsabilidade solidária com as demais rés sob o argumento de que a União não é garante de qualquer empresa mineradora, devendo essas suportar as respectivas indenizações (art. 225, § 2º, da CR).

Sebastião Netto Campos e Álvaro Bocayuva Catão contestaram o feito (fls. 923/48) argüindo preliminares de ilegitimidade passiva, inépcia da inicial, inocorrência de condição da ação e ausência de pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo, e ainda, a prescrição qüinqüenal, na forma do art. 178, § 10, IX, do CC. No mérito, afirmam não ter havido individualização dos danos causados, não podendo ser responsabilizados por danos não causados ou condenados em quantia superior ao prejuízo. Dizem, ainda, que as empresas mineradoras de que foram e/ou são sócios não causaram danos ao meio ambiente, nem mineraram a céu aberto, devendo ser observadas as diferenças entre esse tipo de mineração e o realizado em subsolo. Aduzem serem necessários o nexo causal, a identificação e individualização do fato danoso e do agente causador para gerar o dever de indenizar. Informam a existência de outras carboníferas na região que não constam dos autos. Averbam diferenças existentes entre as diversas empresas, causando danos em extensão e volumes distintos, tornando impossível o rateio na forma requerida. Anotam, ainda, a existência de outras formas de degradação ambiental na região sul. Discorrem acerca dos problemas relacionados com o preço do carvão e as dificuldades financeiras e gerenciais das empresas mineradoras, sem autonomia diante do governo federal, que, inobstante os pedidos realizados, nunca incluiu no preço do carvão parcela destinada à recuperação ambiental. Em relação ao IUM, destinado à aplicação na região em que arrecadado, em benefício da comunidade e em projetos de interesse das mineradoras, os valores arrecadados não foram aqui aplicados. Portanto, cabe aos órgãos governamentais arcar com os ônus dos prováveis danos ocasionados ao meio ambiente. No que se refere ao PROVIDA, afirmam tratar-se de valores irreais, baseados em cálculo político, abrangendo todo o sul do Estado, não sendo, assim, parâmetro à condenação.

Às fls. 955/63 contestam Carbonífera Barro Branco, Cia. Carbonífera Catarinense, Carbonífera Treviso e Fidelis Barato Filho, argüindo, preliminarmente, inépcia da inicial, carência de ação e a prescrição. Dizem não estarem comprovados quais os danos provocados pelos contestantes, o que impossibilita a condenação em indenizar prejuízos que não estão certos que provocaram. Afirmam terem elaborado, em convênio com EPAGRI/FUCRI, plano de recuperação ambiental, em execução desde maio de 1992. Noticiam poluição provocada por outros setores econômicos. Ponderam acerca da situação dos trabalhadores da indústria carbonífera. Alegam ser da União a responsabilidade em virtude de que sempre interferiu no setor carbonífero, determinando quantidade de produção, preço, etc, sem preocupação com a recuperação ambiental, pois não previu parcela no preço do carvão destinada a esse fim. Ademais, os contestantes apenas cumpriram as determinações do poder público. Sustentam ser do Governo Federal a responsabilidade pela execução do PROVIDA, que consideram projeto abrangente, indo além da recuperação das áreas degradadas pela mineração. Quanto aos danos pessoais, entendem que devem ser requeridos em ação própria, pois a indenização deve corresponder ao efetivo dano sofrido e a seu causador. Impugnam a multa pleiteada e a forma de rateio, esta pela falta de relação direta entre o volume de produção e o dano causado.

A IMBRAMIL, às fls. 977/8, argüiu preliminares de carência de ação por falta de interesse de agir e ilegitimidade ativa para a causa. Aduziu a ocorrência da prescrição e, no mais, acolheu as razões expendidas pela Carbonífera Palermo.

Às fls. 982/3 os réus foram intimados acerca do inquérito civil público em apenso a estes autos e foram indeferidas as denunciações da lide à CSN e ao Estado de Santa Catarina. A Nova Próspera agravou na forma retida.

Decididas as impugnações ao valor da causa, foi mantido aquele declinado na inicial.

Foram requeridas as citações da CSN e do Estado de Santa Catarina, na qualidade de litisconsortes passivos necessários.

Oferecida a defesa da CSN às fls. 1016/76. Em preliminar a requerida argüiu a ilegitimidade passiva ad causam, a inépcia da inicial e a nulidade do processo por impossibilidade de citação da CSN e da falta de outro litisconsorte necessário e, ainda, pela ausência do inquérito civil quando da citação. Inicialmente apresenta histórico da exploração do carvão em Santa Catarina e de suas atividades. Argúi a prescrição nos termos dos arts. 177 e 178, § 10, IX, do CC. No mérito, diz jamais ter exercido atividades de lavra; a mineração foi exercida pela Carbonífera Próspera S.A., empresa em que figurava como principal acionista. Realizada a liquidação da Próspera, foram transferidos à CSN os ativos e passivos apurados, destacando-se as licenças e concessões de lavras de carvão, que foram alienadas ou transferidas através de concorrência pública. Não tendo a requerida exercido atividades de extração de carvão, não há qualquer liame fático ou jurídico entre o dano alegado e as suas atividades, porque a obrigação de indenizar decorre do direito violado ou do prejuízo causado, por ação ou omissão própria, e não de terceiro, inexistindo, assim, nexo causal. Aduz que mesmo na hipótese de responsabilidade objetiva é indispensável a verificação da relação entre agente, causa e efeito. Afirma que o MPF sequer dirigiu a ação contra a requerida, somente fazendo-o de maneira inadequada e intempestiva, sem qualquer comprovação de atividade delituosa. Quanto ao PROVIDA, alega não estarem os réus indicados no Decreto instituidor. Diz ser o pedido preferencial juridicamente impossível, porque se postula obrigação futura e não constituída, sendo assim, também afastada a astreinte, bem como o pedido denominado sucessivo. Sustenta que o pedido e o seu fundamento são incompatíveis entre si, porque o PROVIDA abrange exclusivamente entes públicos, não existindo vinculação jurídica entre o projeto e a CSN. Sustenta terem a União, o Estado e os Municípios avocado à Administração pública a responsabilidade integral pela obrigação de recuperar o meio ambiente, com a utilização de recursos públicos e o MPF quer transferir essa responsabilidade para as empresas mineradoras e para a CSN, que era mera acionista de companhia de mineração, bem como estatal controlada pela União até 1991. Diz não ter causado os danos pessoais alegados e que nenhuma prova foi produzida nesse sentido. Ademais, a Lei nº 7.347/85 não ampara tal pedido e não há legitimidade do MPF no pleito de direitos individuais. No que se refere à multa requerida, aduz ser vazia de conteúdo jurídico a expressão 'danos adicionais', faltando certeza e caracterização do prejuízo. Quanto aos juros e honorários, defende que, improcedendo o principal, terão a mesma conseqüência os acessórios e que é vedado ao MPF receber honorários em razão do disposto no art. 128, II, 'a' e 'b', da CR. Alega ser o rateio proposto desprovido de lógica jurídica, uma vez que a reparação dos danos só pode ocorrer dentro dos limites das responsabilidades do causador efetivo do dano. Afirma ser incabida a responsabilização dos sócios na medida em que não há comprovação de que os sócios das empresas tenham descumprido qualquer lei ambiental. Ademais, no caso da ré, até o ano de 1991, a sócia é a União. Quanto ao recolhimento dos valores ao fundo de reconstituição de bens lesados, entende que a forma de cumprimento de eventual condenação deverá ser determinada pelo juiz. Alega que, até 1991, qualquer responsabilidade deve ser atribuída à União Federal, inclusive no que se refere à Carbonífera Próspera; sua conduta sempre foi autorizada e licenciada pela autoridade competente; contribuiu com o Imposto Único Sobre Minerais a fim de abrandar os problemas da região carbonífera. Tece considerações acerca do desenvolvimento das cidades em razão da exploração mineral. Sustenta ser da União, Estado e Municípios a responsabilidade pelo dano causado, especialmente em razão de que as 'regras do jogo' da indústria da extração do carvão eram ditadas pela União. Por fim, diz que o autor não provou ter a CSN causado qualquer dano elencado na inicial.

O Estado de Santa Catarina apresentou contestação às fls. 1.117/35, alegando preliminarmente a inadmissibilidade do litisconsórcio passivo, sua ilegitimidade passiva, a inépcia da inicial, a denunciação da lide à ELETROSUL e a sua admissão como assistente litisconsorcial no pólo ativo. Tece considerações sobre a degradação do meio ambiente na Bacia Carbonífera. No mérito propriamente dito, sustenta que a seqüela causada ao ambiente natural agravou-se no sul de Santa Catarina devido à política energética do governo federal. Alega ter o Código de Minas instrumentalizado o governo federal com poderes para fiscalização e controle ambiental das explorações de jazidas de combustíveis fósseis, cominando obrigações ao titular da lavra, sob pena de caducidade da autorização de pesquisa ou da concessão da lavra (arts. 6º, "c" e "e" e 47, IX, X, XI e XII), contudo restou inaplicado. Afirma ter o titular da lavra a obrigação de indenizar os prejuízos causados a terceiros (art. 47, VIII, do Código de Minas). Sustenta que, em virtude da omissão do Departamento Nacional de Minas e Energia, a União Federal se tornou solidariamente responsável pela composição dos danos causados, mas tal omissão não gera direito adquirido de poluir. Entende que a responsabilidade direta da União se dá em razão de ter incentivado a produção de carvão mineral e de sua omissão no que tange à imposição de medidas de controle. Afirma ser o custo de recuperação das áreas degradadas da região sul catarinense, em conseqüência da extração de carvão, estimado em mais de cem milhões de dólares, valor esse que não se confunde com a totalidade das medidas necessárias a promover o desenvolvimento econômico e social da região. Quanto ao PROVIDA, ainda que o Estado de SC tenha participado da definição das medidas e dos investimentos públicos necessários à despoluição, a União assumiu a obrigação de implementar o programa. No que se refere a sua responsabilidade, sustenta não deter competência, até a Lei nº 5.793/80, para licenciar atividades potencialmente poluidoras, só a partir de então passou a ter atribuição de licenciar a instalação das atividades empresariais, por certo prazo, decorrido o qual o funcionamento depende de renovação da licença, tendo instituído para esse fim a obrigatoriedade dos relatórios de impacto ambiental. Ademais, deu início às medidas para compelir as mineradoras à adoção compulsória de medidas mitigadoras para reverter a degradação ambiental. Nesse sentido, a FATMA realizou programa de controle e defesa ambiental, contratando estudos e projetos a fim de encontrar modelos adequados à região, com resultados positivos. Aplicou, ainda, sanções administrativas às mineradoras, em virtude de descumprimento dos cronogramas acordados. Outrossim, o inquérito civil não apontou qualquer falha na atuação dos administradores públicos estaduais no tocante à extração carbonífera, não havendo, assim, ação ou omissão suscetível de gerar o dano ambiental em questão, não se podendo, portanto, cogitar de responsabilidade do Estado de SC. Por fim, alega estar provada a responsabilidade das empresas mineradoras e de seus dirigentes pela "Proposta do Sindicato da Indústria da Extração do Carvão do Estado de Santa Catarina Referente à Ação Civil Pública da Procuradoria da República" (fls. 54/6 do Inquérito Civil), documento em que as mineradoras comprometeram-se a adotar medidas para reverter o quadro de poluição, confessando, assim, o exercício predatório da mineração.

O Ministério Público Federal apresentou réplica impugnando os argumentos expendidos nas contestações (fls. 1139/49). Sustenta serem incabíveis as preliminares argüidas pelos réus. No que se refere à prescrição, diz que o dano ambiental deve ser entendido como resultado de um processo contínuo, sendo inaplicável, portanto, a tese defendida pelos réus, porque não há uma consolidação de fatos que permita determinar o termo inicial para a contagem do prazo prescricional. Quanto às rés mineradoras, não contempladas pelo privilégio da Fazenda Pública, entende ser-lhes aplicável o prazo prescricional de 20 anos, previsto no art. 177 do CC, porque o art.178, § 10, IX regulamenta questões relativas ao direito de propriedade, não se amoldando à presente lide, que tutela o interesse difuso consubstanciado num meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. Defende a responsabilidade da União sob o aspecto da delegação para a exploração do minério, cabendo-lhe a fiscalização do cumprimento das normas previstas no DL nº 227/67. Tendo se quedado inerte, permitiu a continuidade da destruição do ecossistema local. Aduz que no período anterior a 1981 o ressarcimento segue as regras dos artigos 159 e 1518 e seguintes do CC, considerando-se, ainda, o art. 107 da EC nº 1/69. Desse quadro resulta, no seu entender, a responsabilidade solidária da União, por não ter implementado as medidas punitivas previstas no Código de Mineração. Ademais, a partir da Lei nº 6.938/81, restou estabelecida a responsabilidade objetiva pelo dano ecológico, além de que, Estados e União se obrigam à preservação ambiental, atuando a última supletivamente no que tange ao licenciamento de obras potencialmente lesivas ao ecossistema, tendo a União, entretanto, permanecido omissa. Atribui também ao Estado de Santa Catarina responsabilidade solidária, em virtude dos termos da Lei Estadual nº 5.793/80. Alega não ser óbice a essa responsabilidade o DL nº 1.413/75, ao atribuir exclusivamente à União a paralisação de atividade mineradora, podendo o Estado dispor de multas e licenciamentos concedidos pela FATMA. Quanto às rés mineradoras, afirma estar a exploração de carvão comprovada, com autoria confessada e sem respeito à legislação ambiental. No que se refere ao valor, entende ser aferível pelo PROVIDA e pela produção de cada empresa, conforme informado na inicial, devendo alcançar a efetiva reparação do dano causado, na medida de seu proveito privado. Sustenta ser generoso o preço do carvão, havendo inclusive questionamento acerca do superfaturamento monopolizado, e venda cativa e certa à ELETROSUL. Afirma ser a lavra subterrânea altamente agressiva. Alega não ser a responsabilidade exclusiva da União, uma vez que é objetiva e portanto vinculada ao agente implementador da destruição, no caso, as mineradoras. Diz que o mero licenciamento por órgão ambiental não impede a ação de ressarcimento de danos.

As partes especificaram as provas que pretendiam produzir.

Vieram aos autos informações acerca de ações civis públicas visando à recuperação ambiental, em face dos danos causados pelas mineradoras, que tramitam na comarca de Urussanga (fl. 1196).

O feito foi saneado (fls. 1.201/10). Foram indeferidas a produção das provas requeridas e as preliminares argüidas, restando a matéria atinente à prescrição para ser enfrentada na sentença.

Os agravos retidos interpostos pelos réus (fls.1218/21, 1223/8, 1238/41, 1313/4) foram recebidos e a decisão foi mantida.

Noticiado o falecimento do réu Augusto Baptista Pereira (fl. 1230), o processo foi suspenso e citado seu espólio, que se manifestou nos autos, ressalvando a contestação anteriormente oferecida.

A Companhia Siderúrgica Nacional comprovou a interposição de Agravo de Instrumento (fls.1243/1312).

As partes foram intimadas à apresentação de alegações finais.

Carbonífera Criciúma S.A. vem aos autos, ratificando os argumentos expendidos na inicial, enfatizar as obras de recuperação ambiental que tem realizado (fls. 1398/1405).

Paulo Agrício Freitas, Valdir Darós e a empresa Carbonífera Palermo reiteram e ratificam os termos da anterior manifestação (fls.1407/9).

Às fls. 1410/9 a Companhia Siderúrgica Nacional apresenta um histórico de sua atuação na região, repisa as preliminares já indeferidas e, no mérito, reitera alegações da contestação.

A Massa Falida da Cia. Carbonífera de Araranguá ressalta estar a ação fulminada pela prescrição (fls. 1420/1).

Sebastião Netto Campos e Álvaro Luiz Bocayuva Catão, às fls. 1422/39, repetem os argumentos oferecidos na contestação.

Em suas razões finais (fls.1441/3) a União sublinha a ocorrência da prescrição qüinqüenal e apresenta síntese de sua contestação.

O Ministério Público Federal, por sua vez, diz que as preliminares argüidas já aforam analisadas e repelidas e que as provas produzidas no inquérito civil público foram judicializadas. No que se refere à prescrição, afirma não haver afastamento da responsabilidade da União e do Estado, porque a ação danosa é contínua, protraindo-se no tempo, enquanto não afastado o agente causador do dano. Com relação aos demais réus, deve-se aplicar o prazo ordinário de 20 anos (art. 177 do CC). Alega que o nexo de causalidade estabelecido pelo estímulo à atividade minerária, agregado à ineficácia da fiscalização, de que resultaram graves prejuízos, caracteriza a responsabilidade objetiva da União. Defende a responsabilização das empresas mineradoras e de seus sócios majoritários, na medida em que a atuação das empresas que administravam exorbitou dos limites da lei (art. 28 da Lei nº 8.078/90, arts. 1.518 e 1.521, V, do CC, arts. 10 e 16 do Decreto nº 3.708 e dos arts. 117, 153, 154 e 158, II, da Lei nº 6.404/76). Discorre acerca das causas do dano ambiental e de sua recuperação.

Em sede de agravo de instrumento foi reconduzida a empresa Nova Próspera Mineração S/A, excluída no despacho saneador, ao pólo passivo da lide.

Intimado, o MPF manifestou o seu interesse de prosseguir litigando contra a empresa Nova Próspera Mineração S/A e requer seja antecipada a tutela para que seja determinado o início da recuperação das áreas degradadas pela mineração, sob pena de cominação de multa diária e/ou execução por terceiro.

É o relatório.

Decido.

Preliminares

Foram decididas no despacho saneador as seguintes questões prefaciais (fls. 1201/10): pedido de produção de prova testemunhal e pericial (indeferido); inépcia da inicial (rejeitada); ausência do Inquérito Civil (rejeitada); litispendência (rejeitada); carência de ação (rejeitada); nulidade de citação de alteração do pólo passivo (rejeitadas); inclusão dos Municípios no pólo passivo (rejeitada); ilegitimidade do Estado de Santa Catarina (rejeitada); recusa ao litisconsórcio passivo (rejeitada); denunciação da lide à ELETROSUL (rejeitada); assistência litisconsorcial do Estado de Santa Catarina (rejeitada); ilegitimidade dos sócios das empresas mineradoras (rejeitada); ilegitimidade ativa do MPF (rejeitada); ilegitimidade passiva da CSN (rejeitada); ilegitimidade passiva da Nova Próspera Mineração S/A (decisão que foi objeto de reforma pelo Colendo TRF da 4ª Região, em sede de agravo de instrumento).

Mérito

Prescrição

Minha posição quanto à prescrição em matéria de dano ambiental é no sentido de que não ocorre. É imprescritível o direito de ação que verse sobre dano ambiental. Justifico: O direito ambiental tem conotação patrimonial indireta, pois visa garantir, em última análise, a própria vida no planeta. Portanto, um direito indisponível, irrenunciável e imprescritível.

Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, depois, de afirmarem que "não se aplica à pretensão de indenização do dano ambiental o regime da prescrição relativa ao direito de propriedade", concluem que "o direito ambiental, por ser de ordem pública e indisponível, é insuscetível de prescrição, embora patrimonialmente aferível para efeito indenitário".

A prescrição fulmina o direito de ação por inércia no tempo do titular do direito. Com efeito, se o titular do direito ao meio ambiente hígido não é determinado (titularidade difusa, pois não é possível tratar o direito ao meio ambiente como um direito subjetivo de cada indivíduo da sociedade), como se pode cobrar a ação e punir a inércia ?

Ainda que admitida a prescrição, no caso em tela, tenho que não correu.

Sustenta-se a ocorrência da prescrição qüinqüenal, pois, considerada a presença da União Federal na lide, quando do ajuizamento da ação já teria transcorrido um lustro legal a partir da ocorrência do dano ambiental.

O litisconsórcio que se formou no pólo passivo é facultativo e não necessário, como decorrência da responsabilidade solidária que se caracteriza na espécie, tal como assentado no despacho saneador (fl. 1.201/10) e na decisão do TRF4 no agravo de instrumento (fls. 1.464/77).

Dispõe o art. 48 do CPC, que "Salvo disposição em contrário, os litisconsortes serão considerados, em suas relações com a parte adversa, como litigantes distintos..." Assim, a prescrição qüinqüenal que porventura viesse a beneficiar a União Federal ou o Estado de Santa Catarina em nada afetaria o direito de ação em relação aos demais réus.

Assim, quanto aos particulares o prazo prescricional é de 20 anos nos termos do art. 177 do Código Civil.

A presente ACP considera a atividade mineradora desenvolvida pelas rés num período que vai de 1972 a 1989. A produção efetiva de cada uma das rés, conforme consta da inicial, foi mais intensa neste período. A degradação ambiental, na mesma progressão, sem que se saiba quando começou e quando terminou - até hoje se manifesta de forma contundente -, também se acentou no mencionado período de tempo.

Em casos tais, havendo a continuidade da atividade mineradora degradadora do meio ambiente, a se protrair no tempo, há que se considerar como marco inicial da contagem do prazo prescricional a data em que cessa o evento danoso. Assim, somente quando tivesse cessado a atividade mineradora predatória é que teria se iniciado a fluência do prazo prescricional.

Ainda que remanescesse em favor de alguma das rés - inclusive as pessoas jurídicas de direito público – o argumento de cessação da atividade mineradora danosa ao meio ambiente antes do qüinqüênio, esta alegativa em nada alteraria minha posição. Principalmente porque a redução ou eliminação dos efeitos degradadores não inibe que a poluição se dissemine e persista com o agravamento do quadro já instalado, continuando a produzir efeitos que se protraem no tempo, indefinidamente, impossibilitando que se tenha como certo o marco inicial do prazo prescricional. Vale citar, a propósito, o escólio de Ricardo Kochinski Marconde e Darlan Rodrigues Bittencourt: "Por outro lado, o tempo que dura a inércia não pode, tampouco, ser revelado, pois o dano ambiental pode ter amplitude tal, que venha a repercutir não só nas gerações atuais como nas futuras. Restaria severamente prejudicada a proteção constitucional das gerações futuras a um meio ambiente equilibrado, se fosse admitida a idéia de prescrição. O dano ambiental, é sabido, não se manifesta, necessariamente logo após o acontecimento do sinistro. As relações jurídicas do direito ambiental flutuam em espaço e tempo diversos da relações individuais".

Diante disso, rejeito a prefacial de prescrição qüinqüenal ou vintenária.

Mérito propriamente dito

Tomo a liberdade de iniciar o enfrentamento do mérito da presente Ação Civil Pública fazendo alusão ao que escrevi, em parceria com o Dr. Murilo Mendes, sobre a questão ambiental no artigo nominado Meio Ambiente Mineração:

"A preocupação geral da humanidade pela preservação do meio ambiente é uma questão de sobrevivência, de garantir sobrevida às gerações presentes e de possibilitar vida às gerações futuras. A séria ameaça à vida no planeta desencadeou uma série de ações, de caráter multidisciplinar, tendentes à preservação do meio ambiente, máxime a partir de 1972, quando da realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, donde resultou a Declaração sobre o Meio Ambiente Humano — Declaração de Estocolmo — refletida em vinte e seis princípios que constituíram os postulados da proteção ambiental à época. Mais recentemente realizou-se no Brasil, Rio de Janeiro, a ECO-92, sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, resultando em vinte e um princípios voltados à proteção do meio ambiente.

As advertências da comunidade científica internacional, em especial da Organização das Nações Unidas, repousam, dentre outros fatores irrelevantes ao presente estudo, sobre os elevados níveis de poluição no ar, nas águas, na terra e nos seres vivos em geral e sobre a destruição e o esgotamento dos recursos naturais.

No campo jurídico, surgiu o Direito Ambiental, sub-ramo do Direito Administrativo, com objeto voltado à proteção do meio ambiente, e que pode ser definido como sendo o conjunto de princípios e regras impostos coercitivamente pelo Poder Público competente e disciplinadores de todas as atividades direta e indiretamente relacionados com o uso racional dos recursos naturais (ar, águas superficiais e subterrâneas, águas continentais ou costeiras, solo, espaço aéreo e subsolo, espécies animais e vegetais, alimentos, bebidas em geral, luz e energia), bem como com a promoção e proteção dos bens culturais (de valor histórico, artístico, arquitetônico, urbanístico, monumental, paisagístico, turístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico), tendo por objetivo a defesa e a preservação do patrimônio ambiental (natural e cultural) e por finalidade a incolumidade da vida em geral, tanto a presente como a futura.

Deste importante novo ramo do direito, no concernente ao presente exercício, interessa destacar a principiologia que norteia suas concepções. Com efeito, encontrando-se as leis que dispõem sobre o meio ambiente dispersas em nosso ordenamento jurídico, revela-se impraticável sua aplicação sem que o intérprete lance mão dos princípios gerais que orientam a matéria. Os princípios não se prestam apenas a orientar o aplicador e intérprete das leis ambientais, cumprindo também o papel de ordenar as disposições normativas pertinentes, conferindo-lhes sentido lógico e sistematizado. A doutrina não é unânime ao elencar os princípios fundamentais que regem e informam as relações jurídicas relacionadas com o meio ambiente. Feita a ressalva, destacamos aqueles que nos parecem mais relevantes:

1. Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado

Não há dúvida de que a proteção ambiental é medida de interesse coletivo. O direito ao meio ambiente sadio, aliás, situa-se entre os interesses difusos da sociedade. Não podem ser fruídos por nenhum cidadão de modo particular, senão por todos de forma indistinta. Sendo de interesse eminentemente público, prevalecem sobre os interesses de natureza privada, quando mais não fosse porque a preservação ambiental é fator essencial para, em última instância, assegurar a existência da vida em sociedade. A degradação ambiental, assim, não fere apenas um interesse coletivo, distante e longínquo, mas atenta contra interesses particulares concretos. Por essa razão, orienta-se a doutrina no sentido de elencar entre os princípios basilares do direito ambiental aquele que propugna a primazia dos interesses públicos. Havendo dúvida sobre a aplicação de normas a um caso concreto, deve prevalecer aquela que proteja os interesses da sociedade. Situação muito comum nos dias de hoje, por conta dos altos índices de desemprego, é o argumento de que o empreendimento produtivo, ainda que prejudicial ao meio ambiente, deve ser autorizado. Tal raciocínio não vem, felizmente, obtendo êxito junto ao Judiciário, que na análise do problema tem levado em conta muito mais os interesses gerais da sociedade do que o do grupo teoricamente favorecido por tais iniciativas.

2. Princípio da indisponibilidade do interesse público

Por ser tratar de bem de uso comum do povo (art. 225 da CF), o meio ambiente ecologicamente equilibrado não se inscreve entre os bens suscetíveis de disponibilidade pelo Estado. Ao Estado não é somente vedado dispor em matéria ambiental. Antes, constitui dever indeclinável seu agir em defesa do meio ambiente, evitando agressões que lhe façam os particulares ou mesmo qualquer das entidades de direito público. Ao dever constitucionalmente previsto somam-se as prerrogativas da Administração Pública, entre as quais destacamos o Poder de Polícia, configurando verdadeiro poder-dever que deve orientar o Estado na defesa do meio ambiente. Nesse ponto, é preciso notar que a Constituição distribuiu o dever de proteção ambiental nas três esferas governamentais, dele não se eximindo, portanto, nem União, nem os Estados e nem os Municípios. Na órbita das relações estatais, temos ainda como função institucional do Ministério Público a propositura de Ação Civil Pública para defesa do meio ambiente.

3. Princípio da prevenção dos danos (da precaução)

Em matéria ambiental, prevenir é mais importante do que reconstituir e obter indenização futura por dano já ocorrido. Os prejuízos ao meio ambiente nem sempre são mensuráveis, uma vez que têm repercussões em vários campos da atividade humana. A rigor, pode-se dizer que muitas vezes as lesões ao meio ambiente, conforme o recurso atingido, são irreversíveis, a despeito da possibilidade de condenação do agressor ao ressarcimento do dano causado. Por isso, se afigura imprescindível a prevenção, como medida que se antecipe às agressões potenciais à natureza. Em vista do perigo iminente ou potencial de dano ambiental, deve o Poder Público, assim também como o particular, agir, evitando o surgimento da agressão, ou ao menos estancando desde logo seus efeitos deletérios, se já iniciados. A Administração está habilitada a agir preventivamente, fazendo uso de seu Poder de Polícia. O particular tem ao seu dispor a Ação Popular, que lhe garante eficácia no papel de prevenir o prejuízo ambiental através de provimento liminar, que suste imediatamente a atividade lesiva. O Ministério Público, de sua vez, pode propor Ação Civil Pública e obter, também liminarmente, a paralisação do empreendimento agressor. Todos esses instrumentos existem para garantir a atividade de prevenção ao meio ambiente antes da ocorrência definitiva do dano, sinalizando inequivocamente que a sociedade tem mais proveito quando se antecipa ao prejuízo do que quando espera a ocorrência dele, para ver-se ressarcida somente muito tempo depois.

4. Princípio do desenvolvimento sustentado

O desenvolvimento sustentado é um desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de responder às suas próprias necessidades . Trata-se de um princípio (nº 4) que foi encampado pela Declaração do Rio de Janeiro-92, com o seguinte teor: “A fim de alcançar o desenvolvimento sustentado, a proteção ao meio ambiente deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada de forma isolada”.

José Afonso da Silva afirma que tem aplicabilidade especial nas atividades minerárias “o princípio da exploração sustentável, pois se há recursos não renováveis, os minerais são os típicos, de sorte que devem ser utilizados de forma a evitar o perigo de seu esgotamento futuro”.

Para arrematar estas considerações sobre o Direito Ambiental, convém realçar os principais óbices ao seu desenvolvimento, o que fazemos parafraseando Antonio Herman V. Benjamin, ao destacar os seguintes pontos: (a) o apego exagerado a uma concepção individualista da propriedade; (b) a inserção dos problemas ambientais na esfera privada dos indivíduos, devendo o Estado, por isso mesmo, atuar como um mero espectador das conseqüências negativas da utilização dos recursos naturais, uso este inerente ao exercício do direito de propriedade; (c) ausência de tradição de preocupação com a natureza; (d) a consagração, ainda geral, do princípio da culpa na responsabilidade civil, impossibilitando a reparação dos danos ambientais, individuais ou coletivos; (e) a percepção do direito — e de sua implementação — como regramento de interesses e interesses individuais e, só excepcionalmente, coletivos; (f) a noção de que o Direito apenas indiretamente tem função preventiva, pois sua função principal é, sem inibir a liberdade empresarial, corrigir e reparar os danos.

Quanto ao conceito de meio ambiente, por sua propriedade e amplitude, adotamos aquele ofertado pelo art. 3º, inciso I, da Lei nº 6.938, de 31.8.81, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente: “conjunto de condições, leis, influências e interações, de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.””

Legislação aplicável à mineração e ao meio ambiente e a responsabilidade do causador do dano

Em um primeiro plano, deve-se ressaltar, a teor do que dispõe o art. 20, inciso IX, da Constituição, que os recursos minerais, inclusive os do subsolo, são bens da União, e que a pesquisa e lavra destes recursos só poderão ser feitas por sua autorização ou concessão (art. 176, parágrafo 1º). Sobre a competência legislativa, temos que compete à União, privativamente, legislar sobre jazidas, minas e outros recursos minerais (Constituição, art. 22, inciso XII). Temos ainda que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos minerais em seus territórios (art. 23, XI, Constituição).

Sobre a atividade mineradora vige o Código de Mineração (Decreto-Lei nº 227, de 28 de fevereiro de 1967), que, relativamente ao meio ambiente, em seu art. 47, dispõe: incumbe ao minerador responder pelos danos e prejuízos a terceiros, que resultarem, direta ou indiretamente, da lavra (inciso VIII), e evitar poluição do ar ou da água, que possa resultar dos trabalhos de mineração (inciso XI). Estas disposições já se encontravam no Código de Minas de 1940.

O Decreto-Lei nº 1.413, de 14 de agosto de 1975, dispôs sobre o controle da poluição do meio ambiente provocada por atividades industriais, obrigando as indústrias instaladas ou a se instalarem em território nacional a promover as medidas necessárias a prevenir ou corrigir os inconvenientes e prejuízos da poluição e contaminação do meio ambiente. Este dispositivo atribuía aos órgãos federais competentes a definição das medidas necessárias ao controle da poluição industrial e aos Estados e Municípios, no limite das suas competências, o estabelecimento das condições de funcionamento das empresas industriais.

O Decreto nº 76.389, de 3 de outubro de 1975, dispondo sobre as medidas de prevenção e controle da poluição industrial, definia poluição industrial e atribuía à SEMA - Secretaria Especial do Meio Ambiente - o dever de propor critérios, normas e padrões visando corrigir os efeitos danosos da poluição industrial. Os Estados e Municípios, no limite das respectivas competências, poderiam estabelecer condições de funcionamento das empresas, inclusive quanto à prevenção ou correção da poluição industrial e da contaminação do meio ambiente. Além de outras penalidades, o não cumprimento das medidas necessárias à prevenção ou correção dos inconvenientes e prejuízos causados ao meio ambiente sujeitaria os transgressores à suspensão das atividades a ser aplicada pelo Poder Público Federal.

Em 15 de janeiro de 1976, foi editada a Portaria nº 13, do Ministro de Estado do Interior, estabelecendo a classificação dos cursos d'água e, no que interessa, dispondo o seguinte:

XVII - As indústrias que, na data da publicação desta Portaria, possuírem instalações de tratamento de seus despejos aprovados por entidade pública, e atendam à legislação anteriormente em vigor, terão prazo não inferior a 3 anos nem superior a 6 anos, a ser fixado pelos órgãos de controle de poluição das águas, para se enquadrarem nas exigências desta Portaria, desde que as referidas instalações sejam mantidas em operação com a capacidade, condições de funcionamento e demais características para as quais foram aprovadas.

XVIII - Em casos especiais por solicitação dos órgãos executivos de controle de poluição, o prazo fixado no item XVII, poderá ser reduzido pela SEMA.

XIX - Aos órgãos de controle de poluição das águas compete a aplicação desta Portaria, cabendo-lhes a fiscalização para o cumprimento da legislação bem como a aplicação das penalidades dela previstas, inclusive a interdição de atividades industriais poluidoras, respeitado o disposto no Decreto-Lei n. 1.413, de 14 de agosto de 1975, e sua regulamentação pelo Decreto n. 76.389, de 3 de outubro de 1975.

XX - No caso de inexistir entidade estadual encarregada do controle executivo da poluição, ou se existindo, apresentar falhas ou omissões, ou prejuízos sensíveis aos usos estabelecidos para as águas a jusante, a Secretaria Especial de Meio Ambiente poderá agir diretamente, em caráter supletivo.

XXI - Os órgãos estaduais de controle de poluição manterão sempre informada a SEMA sobre a classificação dos corpos d'água interiores que efetuarem, bem como das normas e padrões complementares que estabelecerem.

XXII - Todos os estabelecimentos industriais que causem ou possam causar poluição das águas, devem informar, anualmente ou quando houver alteração, ao órgão executivo de controle da poluição, o volume e o tipo de seus efluentes, bem como os equipamentos e dispositivos antipoluidores existentes, sob pena das sanções cabíveis, ficando, o órgão competente, obrigado a enviar cópia, dessas informações, à SEMA, a STI (MIC) e ao IBGE (SEPLAN).

XXIII - Em seu território, através dos respectivos órgãos de controle da poluição, os Estados deverão exercer sua atividade repressiva e fiscalizadora dos despejos, ainda que os cursos d'água prejudicados não estejam sob seu domínio ou jurisdição.

XXIV - O não cumprimento ao disposto nesta Portaria, caso as sanções municipais ou estaduais inexistirem ou não se mostrarem suficientes, acarretará para os infratores por iniciativa da SEMA junto aos órgãos federais competentes, as sanções previstas nas letras "a" e "b" do artigo 59 do Decreto n. 76.389, de 3 de outubro de 1975.

Na Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que institui a Política Nacional do Meio Ambiente, encontramos as seguintes disposições concernentes à mineração e meio ambiente:

“Art. 14. Sem prejuízo das penalidades definidas na legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:

I. à multa (...);

II. à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público;

III. à perda ou suspensão de participação, em linhas de financiamentos em estabelecimentos oficiais de crédito;

IV. à suspensão de sua atividade”.

“§ 1º. ...sem obstar a aplicação das penalidades deste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade ...”.

Em 6 de julho de 1982, foi editada a Portaria Interministerial nº 917, do Ministério das Minas e Energia, do Interior e da Indústria e do Comércio, determinando providências por parte da empresas mineradoras, como a apresentação ao DNPM de projetos e cronogramas de execução sobre tratamento de efluentes líquidos originados da drenagem da mina e do beneficiamento do carvão; de transporte, manuseio, disposição final e/ou parcial de subprodutos, produtos ou resíduos sólidos, originados da lavra ou beneficiamento de carvão, e de recuperação da área minerada.

Na Constituição Federal encontram-se assentados os principais cânones sobre meio ambiente, destacando-se o art. 225, parágrafo 2º:

“Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com a solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma de lei.”

Este preceptivo constitucional consagra o princípio do poluídor-pagador cogitado por Herman Benjamin: "é aquele que impõe ao poluidor o dever de arcar com as despesas de prevenção, reparação e repressão da poluição. Ou seja, estabelece que o causador da poluição e da degradação dos recursos naturais deve ser o responsável principal pelas conseqüências de sua ação (ou omissão)".

A Lei nº 7.805, de 18 de julho de 1989, que dispõe sobre a lavra garimpeira, contempla importantes disposições relativas ao meio ambiente:

“Art. 18. Os trabalhos de pesquisa ou lavra que causarem danos ao meio ambiente são passíveis de suspensão temporária ou definitiva, de acordo com o parecer do órgão ambiental competente”.

“Art. 19. O titular de autorização de pesquisa, de permissão de lavra garimpeira, de concessão de lavra, de licenciamento ou de manifesto de mina responde pelos danos causados ao meio ambiente.”

Responsabilidade objetiva do causador do dano ao meio ambiente

A reparação dos danos causados ao meio ambiente, por ofenderem interesses difusos da sociedade, mereceu especial atenção do legislador no campo da responsabilidade civil. Adotou nosso ordenamento jurídico, quanto a essa matéria, a teoria da responsabilidade objetiva, cujo enfoque recai sobre a necessidade de reparação do dano independentemente da aferição da culpabilidade do agente. A importância indiscutível que a proteção ambiental e os demais interesses difusos e coletivos adquirem no mundo moderno impôs ao legislador a adoção de responsabilidade civil fundada no risco integral, como forma de tornar eficaz o ressarcimento dos prejuízos, sem o inconveniente de ter o lesado (no caso, a sociedade) o ônus de provar que o agente agressor agiu culposamente.

A tendência de ampliação do conceito de culpa, inclusive, manifesta-se em quase todos os países, mesmo no campo das relações intersubjetivas, com o intuito de fazer prevalecer os interesses da vítima sobre os do autor do dano . O direito brasileiro contempla várias hipóteses fundadas na responsabilidade sem culpa, entre as quais podemos destacar aquelas previstas nos artigos 160, 1.530 e 1.531 do Código Civil. Se assim ocorre nas relações meramente interpessoais, com muito mais razão se pode dizer que a adoção da responsabilidade objetiva é, no caso de prejuízos causados a toda a coletividade, medida jurídica imprescindível para fazer valer os interesses sociais.


A responsabilidade objetiva adotada pelo nosso ordenamento jurídico, em matéria ambiental, é aquela fundada no risco. Quem exerce atividades suscetíveis de causarem danos ao meio ambiente sujeita-se à reparação do prejuízo, independentemente de ter agido ou não com culpa. O nexo de imputação, pois, que preside a responsabilização do agente degradador é tão-somente a idéia de risco criado, oriundo do exercício de atividade potencialmente lesiva ao ambiente hígido, direito consagrado constitucionalmente.

A teoria da responsabilidade objetiva já estava prevista na Lei nº 6.938, de 31.08.81, que no parágrafo primeiro de seu art. 14 dispunha que o poluidor estava obrigado ao ressarcimento do dano, independentemente da existência de culpa. Tal orientação foi mantida integralmente pelo legislador constituinte, conforme se verifica da leitura do parágrafo 3º do art. 225 da Constituição Federal, que dispõe sobre a responsabilidade do agente pelas condutas lesivas ao meio ambiente, sujeitando-o à reparação do dano causado, sem prejuízo das demais responsabilidades nas esferas criminal e administrativa. A falta de menção expressa do texto constituicional à expressão independentemente de culpa tem levado alguns doutrinadores a conjecturar sobre a real intenção do constituinte. Não me parece, porém, possa haver dúvida a respeito da adoção, pela Constituição Federal, da teoria da responsabilidade objetiva em matéria de dano ambiental. O legislador constituinte, em verdade, ampliou as garantias de defesa ambiental, promovendo a consolidação das normas especiais e gerais vigentes anteriormente à promulgação da Carta Magna. Prova disso é que a defesa do meio ambiente figura como um dos princípios norteadores da ordem econômica, a dizer que o exercício das atividades produtivas deve estar condicionado à observância dos cuidados indispensáveis que deve ter o empreendedor para evitar a degradação ambiental. Conforme averbou José Afonso da Silva, "tendo-a elevado (a defesa do meio ambiente) ao nível de princípio da ordem econômica, isso tem o efeito de condicionar a atividade produtiva ao respeito do meio ambiente e possibilita ao Poder Público interferir drasticamente, se necessário, para que a exploração econômica preserve a ecologia". Portanto, a Constituição Federal, a par de recepcionar a legislação sobre meio ambiente vigente antes de sua promulgação, dispensou ao problema tratamento especial em termos de garantias oferecidas à sociedade, tanto no que respeita ao ressarcimento dos prejuízos causados, como nos casos de intervenção preventiva do Poder Estatal.

A responsabilidade por dano ao meio ambiente é objetiva e obedece à teoria do risco integral. Assim, a indenização é devida independentemente de culpa, e, ademais, pela simples razão da existência da atividade da qual resultou o prejuízo, assumindo o titular da atividade os riscos dela decorrentes.

São quatro as conseqüências da adoção da responsabilidade objetiva fundada no risco integral, segundo fórmula de Sérgio Ferraz :

a) irrelevância da intenção danosa. Já vimos que a responsabilidade objetiva visa garantir antes o ressarcimento do prejuízo, ao invés de perquirir sobre eventual intenção, culposa ou dolosa, por parte do agente. Nesse particular, a responsabilidade objetiva fundada no risco integral difere daquela proveniente do risco administrativo, em que a administração excluirá sua responsabilidade se puder comprovar que o evento danoso ocorreu por culpa exclusiva da vítima.

b) Irrelevância da licitude da atividade. A responsabilização do agente causador do dano funda-se no risco da atividade por ele desempenhada, de modo que, ainda que lícita sua atuação, não poderá ser eximido de ressarcir à sociedade os prejuízos causados.

c) Inversão do ônus da prova. A teoria da responsabilidade objetiva despreza, para efeitos de exclusão da responsabilidade do agente, a noção de culpa. Na verdade os casos de responsabilidade objetiva são de presunção juris et jure, não sendo possível fazer prova da inexistência de culpa. Irrelevante será também se o causador do dano agiu de forma lícita, pois "ainda que haja autorização de autoridade competente, ainda que a emissão esteja dentro dos padrões estabelecidos pelas normas de segurança, ainda que a indústria tenha tomado todos os cuidados para evitar o dano, se ele ocorreu em virtude de atividade do poluidor há o nexo causal que faz nascer o dever de indenizar.”

A doutrina não tem reconhecido a possibilidade de exclusão de responsabilidade nas hipóteses de caso fortuito e força maior. O fundamento é de que o interesse protegido não se coaduna com estas duas formas clássicas de exclusão, pois isso poderia abrir a possibilidade de virem os causadores do dano (geralmente grandes grupos financeiros) se furtar à responsabilização que lhes é imposta pela lei. De fato, a aceitação das excludentes mencionadas significaria retrocesso lamentável, pois o responsável, ainda que não pudesse propriamente se eximir da imputação, teria como usar o argumento do caso fortuito e da força maior para postergar a tramitação de eventual ação que lhe tivesse sido demandada. Vale citar, sobre o tema a lição de Nelson Nery Júnior: "Ainda que a indústria tenha tomado todas as precauções para evitar acidentes danosos ao meio ambiente, se, por exemplo, explode um reator controlador da emissão de agentes químicos poluidores (caso fortuito), subsiste o dever de indenizar. Do mesmo modo, se por um fato da natureza ocorrer derramamento de substância tóxica existente no depósito de uma indústria (força maior), pelo simples fato de existir a atividade há o dever de indenizar.

No que respeita à exclusão de responsabilidade, pois, só resta ao agente a hipótese de provar a inexistência de nexo causal, sendo o único caso em que se pode falar em ônus da prova.

d) Atenuação do relevo do nexo causal. Visto que a única possibilidade de o agressor excluir sua responsabilidade é provar a inexistência de nexo causal entre a sua conduta e o evento danoso, resta saber a quem compete o ônus da prova nessa matéria. A princípio parece ser daquele que propõe a demanda (no caso, o Ministério Público e as demais pessoas legitimadas) o ônus de provar o nexo causal. É o que se depreende da leitura do art. 333, I, do CPC. No entanto, a doutrina vem formando entendimento de que, em face dos dispositivos da Lei nº 8.078/90, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor, a matéria relacionada com o ônus da prova na Ação Civil Pública recebeu outra orientação, cabendo àquele a quem se imputa a prática da ação danosa provar a inexistência do nexo causal. A tal entendimento chegou a doutrina através da análise do art. 21 da Lei da Ação Civil Pública, que dispõe serem aplicáveis àquela ação os dispositivos do Título III da Lei nº 8.078/90. É certo que entre os dispositivos de natureza processual inscritos no Código de Defesa do Consumidor e aplicáveis à Ação Civil Pública não se encontra expressamente a inversão do ônus da prova. Uma análise sistemática e teleológica das normas do Título III do CDC, porém, vem estendendo o alcance daquelas disposições, de modo a possibilitar a adoção da inversão do ônus da prova também naquelas demandas em que não estejam em defesa os direitos do consumidor.

Entendo indiscutível, por outro lado, a caracterização da responsabilidade objetiva para as agressões ambientais iniciadas anteriormente e que prosseguiram, sem solução de continuidade, depois de editada a Lei nº 6.938/81, pois nessa situação configura-se o caso em que a lei posterior, ainda que prejudicial ao infrator, deve ser aplicada, a exemplo do que ocorre nos delitos continuados, em que tanto a jurisprudência quanto a doutrina acolhem a tese da aplicação da lei mais severa, ainda que retroativamente.

A responsabilidade patrimonial solidária dos causadores diretos e indiretos dos danos

Dispõe o art. 1.518 do Código Civil que os bens do responsável pela ofensa ou violação de direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado, e, se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação. Assim, tratando-se de solidariedade passiva, segundo dispõem os arts. 896 e 904 do Código Civil, a dívida comum pode ser exigida, por inteiro, de apenas um dos co-devedores, de alguns ou de todos.

Rodolfo Camargo Mancuso justifica que "se justifica a aplicação do princípio da solidariedade por danos aos interesses difusos, quando se considere: a) que igual regime é aplicado na ação popular, também utilizada na defesa destes interesses; b) a atual Carta Magna prevê que 'as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitam os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados (art. 225, § 3º); c) o regime da solidariedade está na base da estrutura dos interesses difusos".

Trago à colação o escólio de Nelson Nery Júnior: "É curial que deve responder pelo prejuízo experimentado pelo meio ambiente o causador do dano. Não raras vezes, torna-se difícil a identificação perfeita daquele que deu causa ao dano ambiental. Resolve-se este problema com o instituto da solidariedade, instituto que informa a responsabilidade pelo dano ecológico. Não importa para a sociedade, em que proporção a indústria x poluiu o ambiente de determinada região, se mais ou menos que a indústria y. Basta alguma delas haver dado causa, por intermédio de sua atividade, à poluição ambiental, circunstância ensejadora de prejuízo ao meio ambiente, para que exista a obrigação de indenizar, havendo legitimidade passiva ad causam para a ação a que estamos tratando".

Neste sentido é a remansosa jurisprudência:

"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESPONSÁVEL DIRETO E INDIRETO PELO DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE. SOLIDARIEDADE. HIPÓTESE EM QUE SE CONFIGURA LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO E NÃO LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO.
I - A AÇÃO CIVIL PÚBLICA PODE SER PROPOSTA CONTRA O RESPONSÁVEL DIRETO, CONTRA O RESPONSÁVEL INDIRETO OU CONTRA AMBOS, PELOS DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE. TRATA-SE DE CASO DE RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA, ENSEJADORA DO LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO (C.P.C., ART. 46, I) E NÃO DO LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO (C.P.C, ART. 47).
II - LEI N. 6.898, DE 31.8.91, ARTS. 3., IV, 14, PAR. 1., E 18, PARAGRAFO ÚNICO. CODIGO CIVIL, ARTS. 896, 904 E 1.518. APLICAÇÃO.
III - RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO" ( STJ, 2ª TURMA, RESP 37354/SP, DJU 18-09-95, P.29954).

Poder de polícia ambiental quanto à mineração

Preliminarmente, faz-se mister conceituar Poder de polícia ambiental. Para tal, lançamos mão do escólio de Paulo Affonso Leme Machado: “Poder de Polícia ambiental é atividade da Administração pública que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato em razão de interesse público concernente à saúde da população, à conservação dos ecossistemas, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas ou de outras atividades dependentes de concessão, autorização, permissão ou licença do poder público de cujas ações possam decorrer poluição ou agressão da natureza”.

É atribuição comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios o exercício do poder de polícia sobre as atividades poluidoras do meio ambiente, conforme se depreende da interpretação sistemática da normas constitucionais.

O poder de polícia é decorrência da competência legislativa. Portanto, incumbindo à União legislar sobre jazidas, minas e outros recursos minerais (art. 22, inciso XII, CF), dispõe ela de poder ou atribuição de polícia sobre as atividades mineradoras, atividades estas que lhe compete autorizar, conceder, disciplinar e fiscalizar, tendo criado para tal o DNPM, autarquia Federal.

Os Estados e o Distrito Federal possuem competência concorrente para legislar sobre proteção do meio ambiente e controle da poluição (art. 24, VI). Ademais, o art. 23, inciso XI, dispõe ser de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos minerais em seus territórios. O acompanhamento e fiscalização compreendem o aspecto do impacto ambiental, seara para a qual dispõem o DF e os Municípios de competência supletiva para legislar (art. 30, incisos I e II e 32, § 1º). Dessarte, indubitável a atribuição destes entes para também exercerem o poder de polícia sobre atividade mineradora quanto às implicações de ordem ambiental.

A responsabilidade solidária do Poder Público por dano ao meio ambiente

Art. 225 da Constituição: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

A responsabilidade civil do Poder Público por dano ao meio ambiente encontra lastro no dispositivo constitucional antes citado e no parágrafo 6º do art. 37 da Constituição: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

A responsabilidade do Estado, no sistema jurídico brasileiro, em regra, é objetiva e decorrente do risco administrativo, bastando para aperfeiçoar-se a existência do dano e a comprovação do nexo causal entre a ação ou omissão do Poder Público e o dano, independentemente de culpa. No caso da responsabilidade por “falta do serviço”, entretanto, a responsabilidade é subjetiva, dependendo da culpa, mas ocorre a inversão do ônus da prova, incumbindo ao Poder Público, em face da presunção de culpa, provar que o serviço existia e funcionou dentro dos padrões exigidos. Celso Antônio Bandeira de Mello, sobre o tema, assim leciona: “É mister acentuar que a responsabilidade por “falta do serviço”, falha do serviço ou culpa do serviço (faute du service, seja qual for a tradução que se lhe dê) não é, de modo algum, modalidade de responsabilidade objetiva, ao contrário do que entre nós e alhures, às vezes, tem-se inadvertidamente suposto. É responsabilidade subjetiva porque baseada na culpa (ou dolo), como sempre advertiu o prof. Osvaldo Aranha Bandeira de Mello.
Com efeito, para a sua deflagração não basta a mera objetividade de um dano relacionado com o serviço estatal. Cumpre que exista um algo mais, ou seja, culpa (ou dolo), elemento tipificador da responsabilidade subjetiva.
(...)
Outro fator que deve ter concorrido para robustecer este engano é a circunstância de que, em inúmeros casos de responsabilidade por faute du service, necessariamente haverá de ser admitida uma “presunção de culpa”, pena de inoperância dessa modalidade de responsabilização, ante a extrema dificuldade (às vezes intransponível) de demonstrar-se que o serviço operou abaixo dos padrões devidos, isto é, com negligência, imperícia ou imprudência, vale dizer, culposamente.
Em face da presunção de culpa a vítima do dano fica desobrigada de comprová-la. Tal presunção, entretanto, não elide o caráter subjetivo desta responsabilidade, pois se o Poder Público demonstrar que se comportou com diligência, perícia e prudência - antítese da culpa – estará isento da obrigação de indenizar, o que jamais ocorreria se fora objetiva a responsabilidade”.

Vimos que incumbe às três esferas da Administração Pública o exercício do Poder de Polícia sobre atividades potencialmente causadoras de degradação ambiental, em especial, quanto à mineração. A atribuição de polícia administrativa, no caso, impõe ao Poder Público o dever de disciplinar, acompanhar, fiscalizar, e, se necessário, interditar, paralisando a atividade mineradora que esteja causando dano ambiental. Para tanto, criaram-se órgãos e entidades (FATMA, no Estado de Santa Catarina, SEMA, IBDF, CONAMA, DNPM e IBAMA, no âmbito federal) com estrutura para o controle de atividades poluidoras e competência para licenciar, autorizar e fiscalizar estas atividades.

Inoperante o Poder Público em exercer o munus que Constituição lhe impôs, assume o risco de sua inação. O que caracteriza a responsabilidade estatal é exatamente a falta do serviço público (faute du service public), em uma de suas modalidades: não funcionamento, mau funcionamento ou funcionamento tardio. Não basta, entretanto, a atribuição legal de exercer o poder de polícia sobre a atividade poluidora, nem a existência de um aparelho administrativo destinado a tal mister, para que o Estado seja solidariamente responsabilizado. Somente quando o dano ao meio ambiente decorrer de culpa in omittendo ou in vigilando do agente público é que nasce o dever de reparação. Segundo Toshio Mukai , “responsabilidade solidária da Administração, na espécie, dependerá de fatos que comprovem que ela teve conhecimento do iminente dano e não tomou providências; aqui, a inércia é que empenhará a responsabilidade solidária. Portanto, há necessidade de se demonstrar que a culpa existiu, pela incúria, pelo desmazelo ou pela recusa em impedir o evento danoso, evidentemente, com a condição de que o ato lesivo poderia ter sido impedido pelo Poder Público”. Vale lembrar que a responsabilidade objetiva de que trata o parágrafo 1º do art. 14 da Lei nº 6.938/81 somente se aplica ao causador direto e imediato do dano, que, excepcionalmente, poder ser o Poder Público ao desenvolver atividade danosa ao meio ambiente.

Weida Zancaner, tratando de situar a responsabilidade pela falta do serviço, assim se posiciona: "Embora a grande maioria dos doutrinadores inclua a teoria da falta do serviço como pertencente à teoria subjetiva, este entendimento não pode restringir-se ao sentido de culpa conforme àquele aplicado às pessoas físicas. A singularidade do instituto, que deu foros publicísticos à responsabilidade do Estado, deve ser analisada de forma a diferenciar culpa do serviço de culpa pessoal. A culpa do serviço se relaciona com a anormalidade de um serviço público; haverá, assim, anormalidade quando o serviço não funcionar em conformidade com o que deveria ser considerado normal pelas leis ou regulamentos que disciplinam essa atividade afeta à Administração para a consecução do serviço público".

Havendo, pois, negligência do Poder Público, omitindo-se em tomar as precauções para evitar a ocorrência do dano ao meio ambiente, seja pela não implementação de uma política preventiva em relação à poluição mineratória, seja pela omissão em exigir mecanismos de controle ou procedimentos antipoluentes, seja pela autorização indiscriminada de novas frentes de mineração, impõe-se que sejam os entes públicos responsabilizados solidariamente com os causadores diretos do dano.

Paulo Affonso Leme Machado, sobre a responsabilidade solidária da Administração, escreve o seguinte: “Para compelir, contudo, o Poder Público a ser prudente e cuidadoso no vigiar, orientar e ordenar a saúde ambiental nos casos em que haja prejuízos para as pessoas, para a propriedade ou para os recursos naturais mesmo com a observância dos padrões oficiais, o Poder Público deve responder solidariamente com o particular”.

A responsabilidade da União Federal no caso concreto decorre da omissão do Departamento Nacional de Produção Mineral - DNPM, na época mero órgão despersonalizado vinculado ao Ministério da Minas e Energia.

O DNPM, em que pese a crescente poluição ambiental causada pela mineração, tanto quanto ainda hoje ocorre, manteve-se sempre inerte. Detinha ele poder de polícia para interditar, fazendo cessar a atividade mineraria que estivesse degradando o meio ambiente, mas nada fez. Não se sabe a serviço de quais interesses atuavam seus agentes. O certo é que sua atuação sempre gerou um total descompromisso com a questão ambiental. Diria que houve um certo sentimento de impunidade por parte das mineradoras, a despeito das normas protetivas que existiam às mancheias, tal como antes citadas. É imperdoável a cegueira que acometeu os agentes de fiscalização do DNPM, à época sediados em Criciúma, e que não tomaram as providências enérgicas que o problema reclamava.

Quanto ao Estado de Santa Catarina, sua responsabilidade solidária decorre da inércia da FATMA, órgão estatal que somente nos últimos tempos passou a ter uma atuação respeitável, ainda que não satisfatória. Até 1989, entretanto, ninguém foi autuado por mineração poluente. Não se tem notícia de que a FATMA tenha interditado uma mina aqui na região. A marion trabalhou livre e soberana, sem ninguém para perturbar sua atividade extremamente nociva ao meio ambiente. Foi, portanto, omissa a FATMA, caracterizando a falta do serviço, que enseja a responsabilização do Estado de Santa Catarina. Em especial, quanto à poluição das águas, dispõe a Resolução CONAMA nº 20, de 18/06/86 ser da competência dos Estados a fiscalização dos níveis de poluição, a atuação frente à existência de infrações e a aplicação das sanções cabíveis.



Evolução da exploração do carvão na Bacia Carbonífera do Sul do Estado de Santa Catarina

Vale trazer à colação, inclusive para a perfeita caracterização no tempo da intensificação da atividade mineradora na região sul do Estado, excerto do trabalho nominado Diagnóstico Preliminar dos Impactos da Mineração na Área do Morro Estevão e do Morro Albino - Criciúma, publicado na Revista de Tecnologia e Ambiente - UNESC :

"A extração e beneficiamento do carvão configuraram-se, desde o início deste século, como atividades econômicas primordiais no Sul de Santa Catarina. As empresas nacionais de iluminação, gás e ferrovias, impedidas pela I Guerra Mundial de continuar comprando carvão europeu, viram-se forçadas a um processo de substituição de importação, dando início à extração mais efetiva do carvão no Sul. Outro grande impulso veio com a revolução de 1930, que estabeleceu a obrigatoriedade de consumo do mineral, garantindo a sua rentabilidade. Tal processo se aprofunda ainda mais com a II Guerra Mundial, quando houve um aumento na produção, visando, mais uma vez, a substituir o importado.
Para a extração e comercialização do carvão, foi necessário o aparecimento na região, inicialmente, da ferrovia, com um melhoramento do aparelhamento portuário.
O carvão esteve na base do surgimento e desenvolvimento de outros setores econômicos. Por exemplo, já na década de 50, a CSN vê-se obrigada a implantar uma termelétrica (25 mil Kwh), para atendimento regional e absorção do carvão vapor, subproduto do carvão metalúrgico.
(...)
Com a descoberta do carvão, a área carbonífera do Sul do Estado passou a ser objeto de estudos geológicos, dos quais resultariam, efetivamente, o desenvolvimento econômico da região e a base de sua estrutura urbana.
Com exceção de Lauro Müller, a região tinha como primeira atividade econômica, a agricultura e como atividade complementar, a pecuária de subsistência.
Em 1904, o Dr. White, conceituado geólogo norte-americano, faz novos estudos na região, a partir dos quais, entre outro fatos, conclui que o carvão era pobre, mas adequado para uso como energético (gás).
Em 1913, é descoberto, no hoje município de Criciúma, então vila pertencente a Araranguá, o carvão mineral.
Das indústrias carboníferas criadas nesse período, só está em operação a Carbonífera Metropolitana S/A, fundada em 1890.
Até 1914, a indústria extrativa nacional não foi desenvolvida, excetuadas algumas iniciativas isoladas, em virtude da importação do carvão inglês e alemão, de menor preço e melhor qualidade.
No período que corresponde ao Primeiro Conflito Mundial, o carvão catarinense, cuja produção comercial se inicia em 1917, ganhou tamanho destaque, que propiciou condições para a consolidação da indústria carbonífera, primeiro nos municípios de Criciúma e Urussanga, cujas indústrias se encontravam estruturadas pelo uso de plantas de beneficiamento.
Em Criciúma, a atividade de exploração do carvão ganha novo impulso a partir de 1919, com a chegada do ramal da Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina. Nesta época, foram fundadas as grandes empresas carboníferas, como a CBCA, Companhia Carbonífera de Urussanga S/A, Carbonífera Próspera S/A e a Companhia Nacional de Mineração de Carvão do Barro Branco.
Foi com a Revolução de 1930 que se estabeleceu a obrigatoriedade do consumo de 10% do carvão nacional, a partir de 1931 (Decreto nº 20.089, de 09.06.1931), elevando para 20%, em 1940 (Decreto-Lei n. 2.667, de 03/10/40).
A exemplo da Primeira Guerra, novas substituições de importações acabariam sendo realizadas como resultado da Segunda Guerra, em virtude da drástica queda do comércio exterior.
No Sul de Santa Catarina, a interrupção de fluxos comerciais com a Europa faz com que haja a necessidade de valorização do carvão nacional. Aí se encontra a explicação para o novo ciclo de desenvolvimento no Sul catarinense. Ressalta-se que, nesse período, já há uma importante infra-estrutura na região, com destaque para a Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina. As indústrias têxteis, madeireiras e alimentares, a nível estadual, bem como a do carvão, tornaram-se os destaques econômicos nesse período, graças exatamente à vinculação com as necessidades do mercado nacional, num momento em que há dificuldades de importação por razões já expressas. No caso do carvão, há um incremento em sua produção da ordem de 335% entre 1938 e 1945 (as exportações saltaram de 126,5 mil t para 424,5 mil t).
No Sul de Santa Catarina, com o Governo Vargas e a II Grande Guerra, ocorreu a valorização do carvão, cujo consumo é ampliado com a implantação da Companhia Siderúrgica Nacional, CSN, em Volta Redonda (RJ), absorvendo o carvão metalúrgico, e com a Sociedade Termoelétrica do Capivari (SOTELCA), a consumir o carvão energético, criando-se a necessidade de construção, em Capivari de Baixo, ex-distrito de Tubarão, do Lavador de Capivari.
A criação da CSN foi de vital importância para a indústria carbonífera de nosso Estado, pelo fato de ser Santa Catarina o único membro da Federação onde havia a fração coqueificável. Até a década de 1940, o único carvão produzido no país e na região era o energético, consumido em usinas de gás domiciliar, fornalhas de navios, locomotivas e outros pequenos usos.
"A Companhia Siderúrgica Nacional foi projetada para consumir, em seus altos fornos, 50% do carvão metalúrgico nacional, meta que jamais atingiu (o pico de vendas foi em 1980, com 24% das necessidades da siderurgia nacional)".
Como conseqüência da criação da CSN, é implantada sua subsidiária, a Carbonífera Próspera, sob a tutela do governo, que começa a explorar carvão em Criciúma e Siderópolis e, mais tarde, passou a escoar sua produção de carvão-vapor para uma termelétrica de 25.000 kwh.
(...)
Em resumo, sua produção cresceu 33,08% de 1954/55, ano de criação da CEPCAN e voltou a ter um crescimento expressivo (41,69%) no período de 1963/65, por ocasião da inauguração da Usina Jorge Lacerda e da política nacionalista implantada pelo Golpe Militar de 1964.
A recuperação da economia somente ocorreu em 1966 e, já em 1968, o país começou a reapresentar elevadas taxas de crescimento, as quais perduram até 1974, quando o Brasil acusou os efeitos da primeira crise do petróleo (1973), que fez o preço do produto quadruplicar em curto espaço de tempo.
Assim, a Indústria Carbonífera respondeu imediatamente aos impulsos a ela dirigidos, ou seja, o encarecimento do petróleo faz as atenções se voltarem para o carvão, como veremos na seção seguinte.
De 1967 a 1973, vivemos o "milagre brasileiro", um período de extraordinário crescimento econômico (fase de sustentação do desenvolvimento), exibindo uma taxa média de crescimento do PIB de 11,2% ao ano.
Já para a Bacia Carbonífera, a década de 70 marcou a efetiva diversificação da economia regional.
O período de 1975 a 1985 é marcado por um ritmo de crescimento acelerado na exploração do carvão.
O grande choque do petróleo de 1973 foi o desencadeador de uma série de medidas que iriam provocar o crescimento acelerado da produção carbonífera no período de 1975 a 1985. Dessas medidas, as principais razões foram a mecanização nos processos de lavra e a criação de subsídios.
Outro fator que contribuiu foi a incorporação à Eletrosul, em 1971, da SOTELCA, e sua ampliação em 1975 (duas unidades geradoras de 66 Mwh). Em 1979 e 1980 foram construídas outras duas unidades de 125 Mwh, elevando o Complexo Termelétrico Jorge Lacerda a uma capacidade instalada de 482 Mwh., transformando-se no maior complexo termelétrico a carvão da América Latina.
A partir da crise de 1973, com a ocorrência do primeiro choque do petróleo, o governo buscou outras fontes de energia, tais como a produção de álcool, que veio como alternativa para substituir a gasolina, e o carvão, para substituir o óleo combustível, utilizado no setor industrial. Para estimular os empresários a trocar o óleo diesel pelo carvão mineral em combustores e gaseificadores, foram criados incentivos especiais, tais como financiamentos com correção monetária parcial, juros baixos e prazos de carência alongados para implantação dos projetos de substituição de combustível.
O mercado do carvão que até a década de 70 resumia-se praticamente à termelétrica e à siderurgia, com os incentivos acima citados, ganha novos consumidores nos setores industriais da petroquímica, cimento, alimentação, papel, celulose, fumo, cerâmica e outros. Como conseqüência, o carvão energético salta de 1,6 milhões de toneladas vendidas em 1975, para 7,1 milhões, em 1986, quando começa a perder mercados para outros energéticos, principalmente óleo combustível, com preço até hoje administrado pelo governo federal.
Por conta disto, em 1975, o Ministério das Minas e Energia previa sextuplicar a produção do carvão em 10 anos (1975/85) e estabeleceu, como meta de produção, 27,5 milhões de toneladas de carvão até os anos noventa. Nessa época, são implantadas minas de grande porte, com o uso de mecanização, quando o PRÓ-CARVÃO, criado especialmente para alocar recursos e financiar tais projetos, tem papel decisivo em todo o processo de mecanização das minas no Sul de Santa Catarina. Além disso, a adoção de uma política de subsídios bem definida, procurando viabilizar a substituição do petróleo, muito contribuiu para o auge da produção catarinense. Em 1975, cria-se o subsídio à totalidade dos custos de transporte, o que reduz o preço de venda ao consumidor em cerca de 90%.
Em 1974/1975 ocorreu a mecanização com o uso de conjuntos mecanizados americanos, que teve como conseqüência, além dos prejuízos à saúde do trabalhador, o aumento da poluição ambiental, a duplicação da produção, entre 1975/1978, elevando a capacidade de produção de uma mina de grande porte para aproximadamente 9.000 ton/dia de carvão bruto.
Se compararmos a mineração do carvão do início até 1974, com as áreas correspondentes a apenas 2 ou 3 minas de grande porte, implantadas após 1974, percebe-se que estas apresentam-se muito mais extensas que o total antes minerado. As minas primitivas utilizavam técnicas rudimentares, o processo de extração do carvão era manual e não havia preocupação em buscar-se qualquer avanço técnico para o setor.
Na década de 1970, 23.440 pessoas eram dependentes da atividade de mineração de carvão no Sul de Santa Catarina. Seis mil pessoas trabalhavam nas empresas mineradoras. O nível de emprego correspondia a 10% do total da mão-de-obra utilizada em toda a região.
A partir de 1975, com a mecanização, as condições de trabalho nas minas pioraram em função do trabalho ininterrupto e da liberação de grande quantidade de pó do carvão, fruto do aparente e irrisório investimento em técnicas antipoluentes e de medidas de prevenção e controle das doenças profissionais.
"Com o segundo choque do petróleo, em 1979, é criado o Programa de Mobilização Energética, PME, para estimular ainda mais o uso do carvão energético como combustível".
O PME não consegue cumprir seu papel, uma vez que, em 1980, começou-se a gestar a queda do crescimento da produção, que vai ocorrer a partir de 1985. Entre os fatores que geraram a queda está a retirada gradual e sistemática dos subsídios determinada pela Comissão Nacional de Energia.
Em abril de 1983, ocorre a retirada total aos subsídios do preço de venda ao consumidor e mantém-se o auxílio ao transporte, que, em julho do mesmo ano, passou a sofrer redução gradual, cabendo ao consumidor do carvão, situado fora da região de produção, a cobertura parcial dos fretes.
Outro fator não menos importante, que na verdade está na base da retirada dos subsídios, é a recessão brasileira ocorrida entre 1981/1983.
As minas catarinenses produzem, no Brasil, um carvão que, depois de pré-lavado, na boca da mina, apresenta um teor de cerca de 30% em cinzas e um poder calorífico em torno de 5.200 kcal/kg. A fração coqueificável é de 5,4% com teor de cinzas de 18%.
É importante ressaltar que os estados do Paraná e do Rio Grande do Sul não possuem carvão coqueificável, e sua produção de carvão mineral destina-se à geração de vapor em instalações termelétricas e industriais, próximas às áreas de produção.
Na siderurgia, o carvão de Santa Catarina era misturado ao carvão importado, de boa qualidade, resultando um coque com teor de 13,5% em cinzas. A partir de 1991, não há mais produção de carvão metalúrgico, sendo o mercado abastecido com 100% de carvão importado.
(...)
A Indústria Carbonífera enfrentou, na segunda metade da década de 1980, uma de suas maiores crises. Entre os fatores que contribuíram para o início dessa crise do carvão, está a retirada de subsídios à atividade, por parte do Governo Federal, a falta de uma política para o setor, gerando queda no consumo, bem como o fato de o carvão catarinense ser de inferior qualidade, em virtude das características de jazimento, se comparado ao carvão da Colômbia, Polônia, Estados Unidos e da Alemanha.
Amenizados os problemas decorrentes da importação do petróleo, o governo começa a retirar os subsídios da atividade carbonífera. Como já vimos, caem os subsídios de preços em 1983, tendo o início a desaceleração do consumo de carvão nacional, fazendo com que, na década de 1980, possam ser observados dois momentos na produção; um que vai de 1979 até 1985, quando ela continua a crescer só que num ritmo menor que no período anterior (1975/1978) e o outro, a partir de 1986, quando a produção entra em queda livre.
Em 1984, os primeiros sinais da crise já são sentidos: primeiro, com a ameaça de compra do carvão colombiano, que depois de manifestações de alguns segmentos sociais, passa a ser desmentido pelo Ministério das Minas e Energia; segundo, com os elevados estoques nas mineradoras.
Em 1988, com uma situação já desfavorável, são retirados os subsídios que ainda restavam aos fretes e cessa a determinação, pelo Governo Federal, das quotas de produção. É estabelecida, em outras palavras, a livre concorrência, só que não tão livre assim, uma vez que o governo limita o preço do carvão energético a 80% do equivalente em calorias do óleo diesel, que por sua vez, continua com o preço subsidiado.
Em 1988, também é extinta a CAEEB que, no processo de liquidação vende seu estoque à Eletrosul, fazendo com que o Setor Carbonifero catarinense só conseguisse vender 40% da produção do CE 4500 produzido em 1989. Essa situação só é revertida no final de 1989, quando as empresas mineradoras assinaram seu primeiro contrato com a Eletrosul, sem a intervenção direta do Governo.
A retirada dos subsídios e o fim das cotas de produção são as razões do período da queda livre (1986 em diante).
Nesta fase de transição, de 1989 a meados de 1990, observa-se um decréscimo na compra de carvão energético pelo setor cimenteiro. Este, que chegou a consumir cerca de 2,2 milhões de toneladas em 1987, reduziu para cerca de 1 milhão nos anos de 1989, 1990 e 1991.
O Governo Collor marca o início de um novo período da história do carvão, com a desregulamentação da atividade.
Fundamentada nas Diretrizes para a Política do Carvão Mineral, sugeridas por um grupo de trabalho constituído para estudar a problemática do carvão, é decretada, em 17 de setembro de 1990, a desregulamentação da atividade, pela Portaria n. 801. Essa estabelece, entre outras medidas, o fim da obrigatoriedade de consumo do carvão nacional, a liberação dos preços do carvão metalúrgico e energético, a extinção dos sistemas de cotas de produção do carvão, a livre importação de carvão com alíquota zero, a retirada da Companhia Siderúrgica Nacional das atividades ligadas ao carvão, que passa a importar a totalidade do carvão consumido.
(...)
Comparando o pique da produção, que foi em 1985 de 19.294.996 toneladas com a produção de 1994 (5.699.942 ton.), a Indústria Carbonífera catarinense reduziu sua produção em 70,46%. O mesmo aconteceu com a participação de Santa Catarina na produção nacional.
Nos últimos anos, o país voltou a importar carvão metalúrgico de melhor qualidade a um custo mais baixo, o que fez com que o carvão nacional sofresse uma retração no mercado.
Em 1992, após análise das vendas efetuadas pelas mineradoras de Santa Catarina, pode-se constatar que, por setor de consumo, o carvão energético foi destinado principalmente ao setor termelétrico (53,8%) e cimenteiro (24,6%). Já em 1993, o setor elétrico consumiu 65%, o cimenteiro 20%, cerâmico 4%, coque 3%, papel e celulose 2% e outros, 6%.
A grande parte do carvão da região Sul era comprado pelo Governo Federal. Por isso, a partir da importação do produto, o nível de emprego no setor decaiu assustadoramente, atingindo índices alarmantes no último período com o fechamento e privatização da Cia. Próspera, subsidiária da CSN. Também contribuíram a crise na CBCA, que passa para o controle de uma cooperativa dos empregados, e a liquidação do Lavador de Capivari, que operava com carvão metalúrgico e ficou sem atividades, com a importação da totalidade do volume consumido no país".



































Quadro da degradação ambiental na região

De um modo geral, com mais ou menos intensidade, a atividade mineradora, de qualquer espécie, é ofensiva ao meio ambiente, pelo menos enquanto não planejada, indiscriminada, clandestina ou não fiscalizada. Ninguém desconhece os efeitos deletérios da exploração do ouro na Amazônia e no Nordeste, da exploração da cassiterita nos Estados do Amazonas, de Rondônia e do Pará, da mineração de xelita e gipsita no Rio Grande do Norte e Pernambuco, causadoras, dentre outros problemas, de devastação florestal e poluição dos rios, com forte impacto, portanto, sobre a flora, a fauna, as águas, o ar , e principalmente, sobre o homem.

Interessa no presente caso o grave problema da mineração carbonífera, especialmente nas grandes jazidas situadas na Bacia Carbonífera do Sul do Estado de Santa Catarina (Criciúma e municípios vizinhos).

Sinteticamente, pode-se afirmar que a poluição causada pelas atividades de lavra e beneficiamento (lavagem) do carvão decorrem da existência de extensas áreas cobertas de rejeitos piritosos ricos em enxofre e metais pesados, gerando gás sulfídrico e ácido sulfúrico. O ácido resultante da oxigenação de enxofre dissolve os metais e possibilita sua ocorrência em altas concentrações no meio aquático, arrastados pelas águas fluviais. Como o beneficiamento é feito com água, sempre haverá a produção de polpas contendo sólidos em suspensão e sais dissolvidos.
Na deposição de rejeitos sólidos, a degradação verifica-se pela percolação das águas de precipitação sobre a pilha em descoberto. A não compactação e recobertura causam a combustão espontânea, produzindo gases sulfurosos.
No caso da mineração a céu aberto, quando da não-cobertura concomitante à lavra, os efeitos são o aumento da acidez por percolação de águas de precipitação sobre a camada descoberta, ocasionando lagoas ácidas. Além disso, quando não ocorre a revegetação das áreas lavradas e recompostas, ocorrerá também a erosão e esterilização da área.
Na mineração subterrânea, o agravamento da poluição dá-se pelas drenagens das minas e pela subsidência verificada na superfície decorrente do recuo de pilares.
É comum em todos os lugares onde existe a exploração de carvão mineral a ocorrência de sérios problemas hídricos, detectados pela presença, nos cursos d’água adjacentes, de grande quantidades de finos de carvão e minerais associados, aumento da acidez mineral e altos teores de ferro, metais pesados e íons dissolvidos.

No caso específico da Bacia Carbonífera do Estado de Santa Catarina, a inadequada disposição de rejeitos sólidos e das águas efluentes da mineração e beneficiamento de carvão acarretou uma degradação ambiental tão severa que a região foi considerada, pelo Decreto nº 85.206, de 25 de setembro de 1980, a 14ª ÁREA CRÍTICA NACIONAL para efeito de Controle da Poluição e Qualidade Ambiental. Os principais problemas são os seguintes: comprometimento da malha hidrográfica da região em 2/3 (dois terços) de sua extensão; os valores de pH das águas dos rios atingem em certos trechos o nível de 2 a 3 unidades, com elevados teores de acidez e de sulfatos de ferro; grandes extensões da rede hidrográfica encontram-se assoreadas pela deposição de finos e ultrafinos do carvão e dos rejeitos de materiais xistosos e argilosos, com acentuada turbidez e concentrações de sólidos sedimentáveis, concorrendo para incrementar os efeitos de transbordamento verificados na região; prejuízos às atividades agropastoris; as zonas lacustres situadas a jusante das bacias hidrográficas têm sido atingidas por cargas poluentes insuportáveis à manutenção da vida aquática, com sérios prejuízos à indústria pesqueira e turística locais; degradação de extensas áreas rurais e urbanas devido à deposição de rejeitos sólidos em locais e sob forma inadequados.

A bacia do rio Araranguá apresenta elevados níveis de comprometimento, causados principalmente por resíduos da extração do carvão, tendo suas águas elevada acidez, concentração de sulfato, fortes concentrações de ferro, níquel, cádmio e sólidos totais.

O Rio Mãe Lúzia, cujo leito se estende justamente sobre a Bacia Carbonífera, nascendo em Siderópolis e desaguando no Oceano Atlântico, com o nome de Rio Araranguá, por ser o desaguadouro dos Rios Fiorita e Sangão, assim como estes, hoje, é um rio morto, ecossistema impróprio para a vida vegetal ou animal. É fato notório que o Rio Mãe Lúzia deveria ser a fonte principal de abastecimento de água da região de Criciúma, todavia, a exploração do carvão com o lançamento indiscriminado de despejos em seu leito, o tornou impróprio para o abastecimento público (assim como para a irrigação, recreação ou pesca), em razão do alto teor de acidez, metais e sólidos suspensos em suas águas, inviabilizando por completo a captação que se fazia. Restou ao Poder Público utilizar as águas do Rio São Bento, por meio de uma derivação de 20 km de extensão.

Na bacia do Rio Tubarão a poluição também atinge níveis críticos, tanto do rio principal, como dos efluentes, todos comprometidos, principalmente pela mineração a céu aberto. A situação tende a se agravar, assumindo proporções de catástrofe, porque desemboca no maior ecossistema lagunar de Santa Catarina, formado pelas Lagoas de Santo Antônio, Imaruí e Mirim, um dos maiores criadouros naturais de camarão do país. Além da atividade de extração, o beneficiamento de carvão contribuiu para a degradação das águas do Rio Tubarão, cujo leito se encontra comprometido em quase toda a sua extensão. Os níveis de acidez, a concentração de sulfatos, ferro, níquel, cádmio e sólidos totais, especialmente em certos pontos da bacia, encontram-se muito alterados. As águas da bacia servem como fonte de abasteciomento para seis municípios, além de servirem para dessedentar animais, abastecimento industrial, irrigação, recreação e pesca. Todas estas atividades estão comprometidas.

A bacia do Rio Urussanga é a que apresenta a pior situação relativa na região. Pelos levantamentos da FATMA, esta bacia se encontra praticamente toda comprometida pela extração de carvão (inclusive seus efluentes América e Carvão), motivo porque suas águas são impróprias para o consumo humano e apresentam restrições de uso para outros fins. A Lagoa Urussanga Velha apresenta situação bastante crítica, principalmente por ter se tornado depósito dos diversos rejeitos lançados a montante, particularmente pelas indústrias carboníferas.

Especialmente na região de Criciúma, maior centro populacional da região sul do Estado, o quadro é de extrema gravidade. Em trabalho realizado pela CPRM – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, encontra-se o seguinte diagnóstico: “Face ao total descaso e das tímidas iniciativas tomadas pelas empresas mineradoras e autoridades governamentais no sentido de minimizar o problema, este foi sendo gradativamente agravado. Com o decorrer do tempo, a exacerbação das atividades aceleraram o desiquilíbio, imprimindo à paisagem um aspecto desolador, particularmente em áreas de lavra em céu aberto. A poluição é ampla e irrestrita. Grande parte da rede hidrográfica da região que sofreu a exploração mineral está comprometida. A qualidade da água proveniente destas bacias, que drenam uma área com aproximadamente 1.900 Km² em toda região carbonífera, está bastante abaixo dos padrões mínimos exigidos pela OMS e pala Legislação Ambiental Estadual, tornando crítica a questão do abastecimento. Mesmo os mananciais subterrâneos, quando não destruídos pelas atividades exploratórias, mostram sinais de contaminação, apresentando elevados índices de acidez, ferro total e sulfatos. Todos os níveis do processo de mineração do carvão concorrem para a degradação do meio físico e biótico. Desde a frente de lavra, passando pelo beneficiamento, áreas de rejeito, transporte, estendendo-se também ao uso e transformação. Rejeitos piritosos e estéreis, abandonados de forma descriteriosa, comprometem áreas superiores a 5.000 ha na região carbonífera. A lixiviação destas pilhas, por outro lado, contribui para a acidificação do solo e das águas superficiais. Em épocas de cheia, seus rejeitos nocivos agridem áreas de cultivo pela deposição da suspensão piritosa. Comprovadamente, a protencialidade do solo é afetada onde as águas superficiais poluídas são utilizada para o plantio irrigado. Também a subsidência e solapamento da superfície, em áreas de lavra subterrânea, afeta a potencialidade do solo na área rural e ameaça a estabilidade das edificações no centro urbano. A poluição em nível atmosférico se faz através de altos índices de cinzas e enxofre, provenientes da exploração do carvão, somados a outros particulados oriundos da indústria cerâmica, coquerias, oxidação da pirita em rejeitos abandonados, olarias, estufas de fumo e demais indústrias. Afora a agressão que causam ao meio ambiente e biota, os particulados determinam graves prejuízos à qualidade de vida e à saúde das comunidades. Outra forma de contaminação bastante comum é a utilização de rejeito de mineração como material de empréstimo para o aterramento de áreas baixas e posterior construção de vilas e condomínios, além de sua utilização para o recobrimento primário de estradas. A exposição deste material à lixiviação das águas pluviais expande o processo de poluição para áreas sem atividades mineiras”.

Vale lembrar, por fim, que a mineração predatória ainda é uma realidade na região, remanescendo, na visão empresarial, criminosamente, o total descompromisso com a questão ambiental. A propósito, cito notícia veiculada no Jornal da Manhã, periódico local, do dia 12 de outubro:

Mesmo com as várias campanhas de conscientização para a preservação do meio ambiente, a degradação da natureza feita com a extração do carvão parece que está difícil de ser controlada. A carbonífera Belunno, que pertence ao empresário Henrique Salvaro, e que funciona a céu aberto no bairro Rio Fiorita, em Siderópolis, foi interditada ontem à tarde, numa operação conjunta entre a Polícia Ambiental e a Fatma, por ser acusada de estar minerando a uma distância inferior a 30 metros de um rio. "Também estavam descartando efluentes no rio fora dos padrões estabelecidos pela Legislação Ambiental", declarou Jairo Viana, fiscal da Fatma. Além da interdição da área que estava sendo minerada, a empresa foi multada em R$ 6 mil e vai ser obrigada a recuperar, em caráter de urgência, toda a extensão degradada. "Quando chegamos aqui, a máquina estava trabalhando e já tinham feito buracos para que outras detonações fossem feitas, reduzindo a distância da extração e o rio em menos de 10 metros", revelou Viana. "Além de estarem usando dinamite próximo das residências", completou. Outra possível irregularidade, que vai ser analisada posteriormente, é a utilização de máquinas e funcionários da empresa Carbonífera Treviso, numa área onde somente a Beluno tem permissão para minerar. "Isso eles vão ter que explicar, além de estarem descumprindo a determinação da Fatma, outra empresa estava no local", reclamou. A extração irregular foi descoberta numa verificação de rotina. "Vamos aumentar o rigor da fiscalização, fazendo mais operações em conjunto com a Polícia, o Ministério Público Federal e Estadual e a Fatma", avisou o fiscal. Multas pesadas prometem reduzir crimes ambientais. O novo decreto que regulamenta a Lei Ambiental define multas mais salgadas para os infratores. "Antes elas chegavam a R$ 1,5 mil, agora elas podem ultrapassar os R$ 60 mil, e isso já está sendo aplicado na região, agora as carboníferas vão pensar duas vezes antes de desobedecerem a regulamentação da Fatma", avisou o fiscal Jairo Viana. O crime, segundo Viana, cometido pela Belunno, estava prejudicando ainda mais um rio que já foi muito poluído por outras empresas. "Fizemos um trabalho de recuperação e eles estavam degradando ainda mais", relatou. Na mina, que funciona a céu aberto, nenhum funcionário quis se manifestar e, por telefone os responsáveis pela administração foram procurados mas ninguém foi localizado para comentar o assunto".

Ninguém ignora, também, que as ações do passado têm seus efeitos protraídos no tempo e, ainda hoje, causam problemas de saúde aos habitantes da região. Consulte-se, a propósito, notícia veiculada no Jornal da Manhã de 24 de novembro de 1.999, p. 2:

“Depósito de rejeito causa problemas respiratórios

Criciúma – Abandonado há cerca de dez anos, um depósito de rejeito de carvão no bairro Metropol, próximo à rua Onofre Bernardino Lourenço , voltou a ser utilizado. Com isso, os moradores das proximidades sofrem as conseqüências. “Resolveram mexer de novo no depósito, e no começo da noite começa a queimar”, contou o morador Jorge Conforte. O depósito de rejeito fica próximo a uma área residencial, cerca de 300 metros de várias casas. De acordo com ele, quando chove, começa a queimar o enxofre existente no rejeito, formando uma camada de fumaça, que cobre todo o bairro . “A fumaça é pesada e fica no ar por bastante tempo”, conta Conforte. O morador afirmou que a filha, que tem problemas respiratórios, teve seu estado de saúde piorado depois que o rejeito começou a ser retirado. “Ela tem falta de ar constante, e à noite tem que levantar por causa disso e fazer inalação”, conta. Conforte disse ainda que quando não chove, o sereno que cai a noite também faz o rejeito queimar. “O cheiro de queimado é constante”, comentou o morador.

O dano ambiental e o nexo causal em relação à atividade mineradora

O dano ao meio ambiente, segundo Helida Barreira Custódio, “compreende todas as lesões ou ameaças de lesões prejudiciais à propriedade (privada ou pública) e ao patrimônio ambiental, com todos os recursos naturais ou culturais integrantes, degradados, descaracterizados ou destruídos individualmente ou em conjunto.”

A poluição implica dano ambiental, tal como se depreende da regra insculpida no inciso III do art. 3º da Lei 6.938/81.

Art. 3º. Para os fins previstos nesta lei, entende-se por:

III - Poluição: A degradação da qualidade ambiental resultante de atividade que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energias em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos".

O dano ambiental, no caso concreto, está fartamente comprovado. Diria até que se trata de fato notório na região carbonífera e que dispensaria a produção probatória. Ninguém ignora que o meio ambiente na região sul do Estado de Santa Catarina, como decorrência da mineração gananciosa e despreocupada, encontra-se praticamente inviabilizado.

Considero, pois, que os elementos de prova constantes dos autos abalizam os elementos técnicos que nortearam a iniciativa do MPF, dispensando outras provas. Resta certo, pois, como afirma o autor, que os efeitos da mineração, realizada a céu aberto, a descuidada disposição final de rejeitos sólidos e do indiscriminado lançamento de efluentes dos lavadores e das drenagens de minas nos cursos d'água, comprometeram cerca de 4.000 a 5.000 hectares de terras nos Municípios-sedes de minas e usinas, assoreadas e contaminadas as três bacias hidrográficas da região, quais sejam, as bacias dos rios Araranguá, Tubarão e Urussanga e, ainda, atingidas as lagoas de Santo Antônio, Imaruí e Mirim, causando sérios prejuízos à saúde da população, gerando diversas doenças e aumentando os índices de outras, como a anencefalia.

A água, bem vital para a existência do Homem, será um dos bens mais preciosos do terceiro milênio. Segundo estudos da Organização das Nações Unidas (ONU), a crise do abastecimento poderá atingir diversas regiões da Terra nos próximos anos devido à contaminação que ameaça as reservas àgua doce do Planeta e ao aumento da demanda. Hoje, as estimativas indicam que cerca de 10 milhões de pessoas morrem anualmente devido a doenças transmitidas pela água; quase a metade dos animais de água doce, conforme o Fundo Mundial para a Natureza, já desapareceu; em breve teremos conflitos pelo controle da água. A preocupação do Homem com o problema da água não é de hoje. Várias foram as medidas práticas voltadas à recuperação de rios. Basta lembrar o caso do Rio Sena, que há bem pouco tempo não permitia a sobrevivência de qualquer espécie de peixe, e que hoje, em seu leito, podem ser pescados pelo menos cinco variedades. A situação da região sul do Estado de Santa Catarina, entretanto, permanece a mesma, nada tendo sido feito para a solução do grave problema de sua comprometida malha hidrográfica.

Vale lembrar que na indagação acerca do nexo causal é irrelevante a existência de uma ação ou omissão do poluidor, mas apenas da existência do risco. No caso da mineração, enquanto exploração de atividade econômica, assume o risco quem minerar, independentemente de ter ou não contribuído para o dano, obrigando-se a reparar o meio ambiente violado. Destarte, busca-se evidenciar o nexo causal objetivamente, tão somente a partir da existência do dano e do risco de criá-lo. Irrelevante, pois, a licitude da conduta, a necessária autorização da autoridade administrativa competente, a atividade desenvolvida dentro dos padrões exigidos ou a eventual adoção de medidas tendentes a evitar o dano. O risco, portanto, deve ser considerado condição da existência do dano, mesmo quando não se possa demonstrar que foi sua causa direta.

A licença ambiental, a concessão ou permissão de lavra, enfim, a licitude da conduta não afastam a responsabilidade

Ainda que devidamente autorizada ou licenciada, a atividade mineradora que se revele ofensiva ao meio ambiente enseja a reparação, isto porque não outorgam, nem poderiam outorgar, o direito de degradar o meio ambiente. Com efeito, a licitude reside apenas no minerar, no explorar racionalmente a jazida, e a própria legislação que trata da matéria ressalva o dever de reparar para aquele que, possuidor do direito, ao exercitá-lo causa o dano ao meio ambiente (vide retro).

O dano ambiental se aperfeiçoa independentemente do desrespeito a qualquer padrão normativo de emissão de poluentes. Portanto, mesmo licenciada, a atividade que cause lesão ao meio ambiente, afetando seu equilíbrio, gera responsabilidade civil ambiental ao seu agente. A atividade é lícita, mas o resultado é ilícito.

A propósito, trago à colação o escólio de José Afonso da Silva: "Não se exonera, pois, o poluidor ou degradador a prova de que sua atividade é normal e lícita, de acordo com as técnicas mais modernas. Lembra Helli Alves de Oliveira a doutrina da normalidade da causa e anormalidade do resultado, que fundamenta a reparação, no caso da responsabilidade objetiva. Não libera o responsável nem mesmo a prova de que a atividade foi licenciada de acordo com o respectivo processo legal, já que as autorizações e licenças são outorgadas com a inerente ressalva de direitos de terceiros, nem que exerce a atividade poluidora dentro dos padrões fixados, pois isso não exonera o agente de verificar, por si mesmo, se sua atividade é ou não prejudicial, está ou não causando dano”.

A jurisprudência não discrepa:

"Tratando-se de resíduos em rio existente na vizinhança, o fato de a empresa haver obtido licença de localização e pagar os tributos municipais não a exime de atender aos textos legais referentes à preservação do meio ambiente" (TJRJ, MS 189/86, j. 25/03/87, RTJTJRJ 4/297).

A irrelevância do recolhimento do Imposto Único sobre Minerais (IUM)

O produto da arrecadação do IUM não tem vinculação com a restauração do meio ambiente degradado com a mineração. O IUM é um imposto, portanto, não está vinculado à contraprestação por parte do Poder Público.

Defesas baseadas na negativa do nexo causal

Uma mesma ação sobre o ambiente pode ser causadora de diferentes danos, tanto pessoais como patrimoniais ou ainda ecológicos. A poluição de um rio pode causar danos na saúde dos banhistas desprevenidos, das pessoas que bebem a água contaminada ou daquelas que consumam o peixe aí pescado ou os produtos agrícolas cultivados nas suas margens; pode provocar danos patrimoniais aos proprietários e aos agricultores ribeirinhos, aos pescadores cuja subsistência dependa o rio inquinado ou aos operadores turísticos da região; como causará igualmente danos ecológicos traduzidos na destruição da fauna e da flora do rio, assim como a perda da qualidade da água, necessários ao natural equilíbrio ecológico do ecossistema danificado.

São irrelevantes, considerada a solidariedade antes salientada em matéria de reparação de dano ambiental, as alegativas de maior ou menor participação na degradação ambiental causada pela mineração na região sul, bem assim o fato de uma ou outra empresa ter adotado medidas de controle da poluição ambiental, o que só teve o condão de eventualmente reduzir os efeitos de um dano já consumado.

Não aproveita também às mineradoras as alegativas de não terem minerado a céu aberto e de terem depositado corretamente os rejeitos sólidos. Existe um certo consenso na região carbonífera, em razão mesmo de ser fato notório e opinião comum do povo, que a atividade de mineração sempre se fez sem qualquer preocupação com o meio ambiente. Afinal, nenhum habitante da cidade desconhece os efeitos deletérios da mineração na qualidade do ar, das águas e da terra. São cartões-postais das cidades de Criciúma, Urussanga, Siderópolis e Capivari de Baixo as imensas paisagens lunares, com crateras e áreas de deserto, decorrência única e exclusiva da mineração indiscriminada. A malha hidrográfica está comprometida em dois terços de sua extensão. O juiz, embora não possa se valer de seus conhecimentos particularizados dos fatos para julgar a causa, é um ser social que vivencia os problemas que afetam a comunidade. Não me poderia passar despercebida a situação dramática da região carbonífera em razão da poluição ambiental causada pela mineração. Resido próximo de uma região de mineração, em Criciúma, e, diariamente, meus olhos se defrontam com depósitos imensos de rejeitos piritosos, que estão nas ruas, nas águas e em todo o lugar. Os dados técnicos constantes dos autos confirmam a caótica situação e fazem soar mal a pretensa exclusão de responsabilidade daqueles que mais poluíram. Com efeito, se medidas eficázes tivessem sido adotadas, em tempo hábil, o quadro ambiental não estaria tão degradado.

É certo que as empresas que mineraram a céu aberto têm maior parcela de contribuição para a degradação ambiental. Mas nem por isso se pode afastar a responsabilidade daquelas que mineraram em subsolo, isto porque o mínimo dano - e se sabe que mesmo a mineração de subsolo também causa danos ao meio ambiente -, desde que se possa configurar o nexo causal entre a ação e o evento danoso, na responsabilidade solidária, que caracteriza a espécie, impõe o dever de reparação, conforme escolha do titular da ação.

É preciso não perder de vista, por derradeiro, nesta questão do nexo causal, que a incerteza científica sobre a relação de causa e efeito entre o dano ocorrido e a atividade particularizada de um possível poluidor, vale dizer, a ausência de certeza da existência do nexo causal, não faz incidir na seara ambiental a presunção de irresponsabilidade, cuja relevância determina a prevalência da teoria do risco, substituindo-se à prova cabal e impondo, diante da existência de um conjunto de evidências, a condenação.

Defesas baseadas nas decadência da atividade minerária

A crise porque passa - ou passou - o setor carbonífero não serve de pano de fundo para isentar as empresas mineradoras e seus representantes da responsabilidade pela reparação do dano ambiental que causaram. Como qualquer outra atividade empresarial, em uma economia recessiva, mormente porque dependente de medidas governamentais, a mineração se submete aos riscos naturais do empreendimento. O que impressiona e torna falacioso este argumento é a circunstância de nada ter sido feito, pelas empresas mineradoras, durante o período em que a extração do carvão era extremamente rentável. Naqueles tempos, e isto se comprova pela ostentação pessoal de mineradores, sobrava dinheiro, mas muito pouco foi aplicado em sistemas de contenção da poluição ambiental. Algumas minas faliram, outras simplesmente fecharam, deixando para trás um rastro de destruição, mas raros são os proprietários que não angariaram fortuna pessoal.

Defesas baseadas na responsabilidade exclusiva da União Federal

Ainda que tenha a União Federal minerado, adquirido o produto final da mineração e, sobretudo, incentivado a extração como política econômica, não se lhe pode atribuir a responsabilidade exclusiva por todo o processo de degradação ambiental dominante na região. É fato que sua responsabilidade também decorre destas ações, cumulativamente com sua inércia em fiscalizar as atividades, tal como se deixou antes assentado. Mas tal responsabilidade não descaracteriza a daqueles que, desempenhando a extração do carvão como atividade empresarial, o fizeram sem um mínimo de preocupação em relação à vital questão ambiental, assumindo o risco de ter que responder pelos danos causados. Novamente vem à tona a natureza solidária da responsabilidade por dano ambiental, justificando a atribuição dos ônus a todos quantos tenham, de qualquer forma, contribuído para a ocorrência do evento.

Defesas baseadas na aquisição posterior de empresa mineradora e no encerramento das atividades

Não socorre às empresas mineradoras que adquiriram áreas já mineradas e degradadas o argumento da irresponsabilidade. É cediço que na transferência de empresas o adquirente assume, salvo convenção em contrário, a responsabilidade pelo passivo, especialmente, o passivo ambiental da empresa por qualquer forma adquirida, ressalvada a existência de expressa cláusula contratual em sentido contrário, o que faria a responsabilidade apenas subsidiária.

Da mesma forma, não isenta de responsabilidade o encerramento das atividades. O fechamento de uma mina, além de aumentar os riscos de acidentes em certos casos, não faz cessar o processo poluidor, que persiste enquanto houver material piritoso exposto à oxidação, podendo se estender por décadas.

Defesas que sustentam a falta de mensuração do dano e da individualização das condutas

Quem pode medir o dano ambiental causado pela mineração indiscriminada na região carbonífera do sul do Estado? Ninguém pode. E não se pode medi-lo porque o dano ambiental não comporta mensuração. Exatamente por isso atribui-se aos causadores do dano a responsabilidade solidária, que independe do alcance do dano causado, como se disse alhures. A ação pode ser proposta contra um, alguns ou todos os causadores do dano, independentemente da maior ou menor participação no dano. Se alguma empresa entende que poluiu menos do que outra, e tiver que responder por mais do que devia, tal circunstância não diz respeito a esta ação, devendo resolver-se na via regressiva.

No caso de pluralidade de agentes a desencadear o resultado, sem que se possa precisar a forma ou mensurar o alcance de cada uma das ações ou resultados, sabendo-se apenas que o prejuízo decorreu da ação conjunta de todos, resolve-se a questão pela aplicação do art. 1.518, caput, do CC, impondo a responsabilidade solidária.

A responsabilidade dos representantes, sócios gerentes e mandatários das pessoas jurídicas e seus sucessores

As alegações de ilegitimidade passiva dos sócios, gerentes e mandatários das empresas de mineração foram rejeitadas pelo despacho saneador, onde deixei sucintamente assentado o seguinte: “A legitimidade passiva dos sócios da empresas mineradoras encontra fundamento legal em várias disposições. Atente-se, por exemplo, ao que dispõe o art. 225, parágrafo 3º, da CF/88:

"As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, às sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados".

Ademais, sabe-se que algumas das empresas de mineração responsáveis pelos danos ao meio ambiente poderão não ter condições de arcar com os ônus de eventual decreto condenatório. Portanto, não se pode recriminar a inclusão dos seus sócios-gerentes no pólo passivo da lide.

Com razão o MPF (fls. 1143/4) quando faz ver que os sócios majoritários das empresas, ao permitirem as atividades degradadoras do meio ambiente (ilícitas), cometeram abuso dos seus estatutos ou contratos sociais, violando também a lei. Esta situação, à similitude do que ocorre por disposição expressa do CTN (art. 135) e do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90, art. 28), autoriza que o juiz desconsidere a personalidade jurídica da sociedade.

Vale lembrar, também, que a responsabilidade ambiental é tida como solidária, à luz do art. 1.518 do CC, porque resultante de ilícito. Esta solidariedade também existe entre a pessoa jurídica e os seus sócios-gerentes, que, em última análise, auferiram os proveitos financeiros da atividade poluente”.

Dentre as hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica encontra-se a quebra do princípio da autonomia, por abuso de direito, ocorrente quando no exercício de algum direito da pessoa jurídica, se ultrapassam os seus limites, alcançando a conduta um objetivo ilícito – no caso a degradação ambiental -, ainda que não tenha havido o propósito de causar o prejuízo, mas havendo simplesmente um desvio do direito da sua finalidade. No item que trata da legislação aplicável à mineração deixou-se assentado que a extração de carvão de forma nociva ao meio ambiente sempre foi ilegal, daí concluir-se que os mandatários das empresas mineradoras agiam ao arrepio da lei quando geriam seus negócios. Dessarte, obrigam-se solidariamente os representantes, sócios-gerentes ou mandatários das empresas rés, e, se falecidos estes, seus sucessores (estes até o limite das forças da herança e na proporção do que cada um dos herdeiros houver recebido, na forma dos arts. 1.587 e 1.796 do CC), devendo responder pelos efeitos da condenação.

A situação da Nova Próspera Mineração S/A

Esta empresa foi excluída da lide no despacho saneador, onde deixei consignado o seguinte: "A empresa Nova Próspera Mineração S/A, constituída em 15 de julho de 1991, adquiriu da CSN, em 23/08/91, os direitos de lavra referentes a uma área de 41.221.55 hectares, tendo assumido a vendedora a responsabilidade pelos encargos ambientais anteriores a 01/10/91. Dessarte, quanto a este período, inaplicável ao caso a teoria da responsabilidade por sucessão, impõe-se responsabilizar a CSN pelos danos ao meio ambiente, os quais, aliás, foi ela que causou. Ressalte-se que, pelo teor da inicial, a degradação ambiental considerada nesta ação atinge um período em que sequer existia a Mineração Nova Próspera S/A. Excluo da lide a empresa Nova Próspera Mineração S/A, por manifesta ilegitimidade passiva".

O TRF da 4ª Região, sem atentar para o período de mineração que o MPF utilizou para atribuir a responsabilidade das rés, até 1989, reconduziu a referida empresa ao pólo passivo da lide.

O MPF, em sua manifestação de fls. 1479-1480, refere que a questão diz respeito ao mérito, subsistindo a responsabilidade do tipo subsidiária da empresa Nova Próspera em relação à responsabilidade principal da CSN, e também em decorrência da mineração ocorrida posteriormente a 1991, que também causou danos ambientais.

Enfrentando a questão no concernente ao mérito, tenho como inviável a responsabilização solidária da empresa Nova Próspera Mineração S/A no período em que minerou na região (23/08/91 a 06/07/96), pois não se tem dados técnicos sobre a mineração neste período. Para tal não tem qualquer serventia o Inquérito Civil presidido pelo MPF. Ademais, as razões de pedir do MPF dizem respeito, com relação a todas as rés, a um período de mineração que vai até 1989.

Remanesce, como bem observou o MPF, apenas a responsabilidade subsidiária da empresa Nova Próspera Mineração S/A, para o caso de impossibilidade de a CSN arcar com os ônus da reconstituição ambiental. Nesta hipótese, sobrepõe-se o dever de indenizar transferido na sucessão empresarial ao que fora pactuado entre as empresas.

A reparação do dano

Como decorrência da adoção da responsabilidade objetiva, calcada no risco integral, nasce a obrigação de reparar com a ocorrência do dano e do nexo causal.

Sabe-se que a reconstituição do meio ambiente afetado, para que seja ele reconduzido ao status quo ante (desiderato quase, senão, impossível), constitui a reparação primária e principal, subsistindo a indenização como forma de recomposição subsidiária. De lembrar, no caso, o princípio da efetividade da prestação jurisdicional, traduzido na célebre lição de Chiovenda, segundo a qual é função do processo dar a quem tem direito tudo aquilo e precisamente aquilo a que tem direito. Neste sentido o escólio de Teori A. Zavascki, ao dizer que "a tutela do direito por execução genérica, ou seja, mediante prestação substitutiva - que, no geral das vezes, é representada por equivalente em dinheiro -, deve ficar restrita apenas àquelas situações em que não for realmente possível o atendimento da prestação in natura. Deve ser a exceção e não a regra".

Pedidos do MPF

Requer o MPF sejam compelidas as mineradoras e a União a projetar e executar a recuperação da região sul (Municípios arrolados no Decreto do PROVIDA-SC), com início da execução dos trabalhos em janeiro de 1996 e conclusão no ano 2.000, contemplando as áreas de depósitos de rejeitos, áreas mineradas a céu aberto e minas abandonadas, bem como o desassoreamento, fixação de barrancas, descontaminação e retificação dos cursos d'água, além de outras obras que visem amenizar os danos sofridos principalmente pela população dos municípios-sede da extração e do beneficiamento, bem como seja cominado aos requeridos a pena de multa de 1% do valor da causa por mês de atraso no cronograma de execução.

Sucessivamente, em caso de demora que inviabilize o início dos trabalhos de recuperação em 1996, formula pedido de condenação das mineradoras e da União à entrega de quantia equivalente a US$ 95.902.079,00 (noventa e cinco milhões, novecentos e dois mil, setenta e nove dólares americanos), valor necessário estimado para a realização do Projeto de Recuperação da Qualidade de Vida da Região Sul de Santa Catarina (PROVIDA-SC), acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, e à indenização dos danos pessoais acarretados à população dos municípios-sede da extração de carvão, estimados em um salário mínimo por habitante, valores a serem aplicados, nas comunidades mais diretamente atingidas, em obras complementares como hospitais e escolas especializados. Requer, ainda, a condenação dos réus à pena de multa, a título de compensação à população em virtude do atraso no início da execução da sentença, de 10% do valor da condenação a título de danos pessoais, ao ano e honorários advocatícios. Ademais, pede seja o valor da condenação rateado entre os requeridos em razão do montante de carvão extraído no período de 1972 a 1989, arcando a União com o percentual relativo à extração precedente e com a parcela do dano que por qualquer razão não for recomposta por alguma mineradora ou seu sócio-administrador e que os sócios que geriram as empresas mineradoras sem atenção à lei sejam solidariamente responsáveis. Requer a condenação das mineradoras à recomposição dos danos individuais inflingidos nos últimos vinte anos e que vierem a ser apurados nas liquidações de sentença promovidas pelos lesados. Ao final, pede seja o valor resultante da condenação recolhido, em dinheiro, devidamente corrigido, a fundo para reconstituição dos bens lesados.

Alcance do dever de recuperação do meio ambiente afetado

Deixou-se antes assentado que a responsabilidade por dano ambiental é solidária (ut retro), mas esta solidariedade encontra limites na configuração do dano e no correlato dever de indenizar. O dano causado ao ar, à terra e às águas da região carbonífera é um só, e afeta todo o ecossistema. Embora tenha se aperfeiçoado ao longo do tempo, é uno, indivisível e tem como causa fundamental a mineração. Sabe-se que esta degradação ocorreu em razão direta da atividade minerária, mas não se sabe exatamente se foi esta ou aquela mina quem mais poluiu. Ainda que se alegue que outros fatores têm contribuído para a poluição da região, como aqueles decorrentes da agricultura (uso indiscriminado de agrotóxicos e erosão), os dados técnicos estão a comprovar que nada se compara aos efeitos da mineração. Até porque, regiões vizinhas, eminentemente agrícolas, não enfrentam problemas semelhantes. Assim, a solidariedade autoriza a opção de ação contra um, alguns ou todos os poluidores. Optou o MPF, atento à regra da solidariedade, por implicar as mineradoras. Nelson Nery Júnior ensina que, “não existe, para o nosso direito positivo, relevância quanto à separação entre causa ‘principal’ e causa ‘secundária’ do evento danoso para diminuir ou excluir o dever de indenizar. Se da atividade do agente resultar dano ressarcível, há este dever.”

Assim, ainda que existam diversas frações de áreas degradadas em que é perfeitamente possível definir-se ou determinar-se que chegaram ao estágio atual em razão direta da mineração específica levada a efeito pela empresa X ou Y, tal como a extensão de solo de propriedade da respectiva mina, utilizada para mineração a céu aberto ou para depósito de rejeitos piritosos, a responsabilidade não deixa de ser solidária. Quanto a estas áreas, penso, como medida de ordem prática e para ressalvar o direito daquelas empresas que já tomaram algumas providências saneadoras, poderá o titular da presente Ação Civil Pública exigir que a reparação se faça direta e exclusivamente pela mineradora responsável pelo dano, se assim o desejar.

Em relação ao pedido principal, restou prejudicado o cronograma sugerido pelo MPF, em razão do decurso do prazo ali sugerido.

Ante o exposto: 1. julgo procedente o pedido principal, para condenar as empresas mineradoras que figuram no pólo passivo, seus sócios-gerentes, mandatários ou representantes (ou sucessores), a União Federal e o Estado de Santa Catarina, solidariamente, ressalvada empresa Nova Próspera Mineração S/A, cuja responsabilidade é apenas subsidiária da responsabilidade da Companhia Siderúrgica Nacional - CSN, a apresentar, dentro de 6 (seis) meses, a partir da intimação da sentença, um projeto de recuperação da região que compõe a Bacia Carbonífera do Sul do Estado, contemplando, no mínimo, todos os itens assinalados no PROVIDA-SC, com cronograma mensal de etapas a serem executadas, e executar dito projeto no prazo de 3 (três) anos, contemplando as áreas de depósitos de rejeitos, áreas mineradas a céu aberto e minas abandonadas, bem como o desassoreamento, fixação de barrancas, descontaminação e retificação dos cursos d'água, além de outras obras que visem amenizar os danos sofridos principalmente pela população dos municípios-sede da extração e do beneficiamento; 2. é cominada aos condenados a pena de multa de 1% do valor da causa por mês de atraso no prazo de entrega do projeto ou no cronograma de execução; 3. em caso de não acatamento da ordem emanada neste decisum, sem prejuízo da incidência da pena pecuniária cominada, como medida de sub-rogação, será contratado, às expensas dos condenados, terceiro para que elabore e execute o projeto (art. 461, § 5º, CPC); 4. ficam as mineradoras ainda em atividade obrigadas a ajustar suas condutas às normas de proteção ambiental, comprovando, no prazo de 60 dias, sob pena interdição, o cumprimento de todas as exigências legais, junto à FATMA e ao DNPM, que deverão apresentar, em idêntico prazo, relatório circunstanciado de visita fiscalizatória em todas as minas em atividade na região, comprovando as eventuais medidas de esclarecimento e punição que adotarem (art. 461 do CPC); e 5. Cumpre ao autor da ação, diretamente ou através de outra entidade que venha a indicar, opinar sobre o projeto a ser apresentado, que será objeto de chancela judicial, fiscalizando sua execução, até a conclusão.

Tendo em vista que a presente Ação Civil Pública foi proposta pelo MPF, no uso de suas funções institucionais, dispensando, dessarte, o patrocínio de advogado, resta despicienda a condenação em honorários advocatícios (art. 18 da Lei nº 7.347/85).

Sentença sujeita ao reexame necessário.

Custas, ex lege.

P.R.I.

Criciúma, 05 de janeiro de 2000.


PAULO AFONSO BRUM VAZ
Juiz Federal da 1ª Vara
Circunscrição Judiciária de Criciúma/SC

Quem sou eu

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Nascido em 22/07/1951, em Praia Grande/SC, na beira do rio Mampituba, próximo às encostas dos Aparados da Serra, portanto embaixo do Itaimbezinho, o maior cânion da América do Sul, contudo, orgulha-se de haver recebido em 2004, o Título de Cidadão Araranguaense. Residiu em Fpolis onde exerceu por dez anos a função de projetista de edificações e realizou o documentário em Super 8 sobre as eleições pra governador em 1982, onde consta em livro sobre a história do Cinema de SC. Casado, pai de dois filhos (um formado em Cinema e outro em História) reside em Araranguá. Instalou uma das primeiras locadoras de vídeo do estado. Foi um incansável Vídeomaker e Fotógrafo. Fã de Cinema sempre. Ativista ambiental da ONG Sócios da Natureza (Onde assumiu a primeira presidência do Comitê da bacia hidrográfica do rio Araranguá – na época um fato inédito no ambientalismo). É um dos autores do livro MEMÓRIA E CULTURA DO CARVÃO EM SANTA CATARINA: Impactos sociais e ambientais. www.vamerlattis.blogspot.com